quarta-feira, 22 de julho de 2009

O "Bom" e Velho Racismo Americano!

Malcolm X (1925-1965) certa vez fez uma piada, com seu humor ácido, que resumia a situação da classe de intelectuais negros nos EUA nos anos 1950/1960: "What do you call a Black man with a Ph.D.?... A Nigger!" Essa máxima foi vivenciada de certa forma pelo renomado professor e diretor do W. E. B. Du Bois Institute da prestigiosa Harvard University, Henry Louis Gates Jr. O intelectual está listado entre os 20 mais importantes professores da instituição, é considerado um das mais influentes personalidade americanas, organizou, junto com o filósofo Kwame Anthony Appiah, a enciclopédia Africana (2005) e é o autor do famoso Thirteen Ways of Looking At Black Man (1998). Infelizmente, na última quinta-feira (16/7), Gates foi visto apenas de uma forma, como afirmou Brandon M. Terry em seu artigo, brincando com o título do livro do acadêmico.

Skip Gates

Após uma cansativa viagem de volta da China, onde fazia pesquisas para seu novo documentário, às 12:30 da tarde Gates, junto de sua bagagem, se encontrava na lareira de sua casa num bairro de classe alta de Cambridge. O professor forçava a porta da frente e a cena foi vista por uma vizinha que chamou a polícia. Quando os policiais chegaram Gates já estava dentro de sua residência, pois havia entrado pelos fundos e desligado o alarme, e falava ao telefone com a empresa responsável pela segurança da casa. Começou uma discussão entre Gates e um dos policiais que exigia que Gates se identificasse e comprovasse a propriedade do imóvel (mesmo havendo uma série de fotos de Gates junto de personalidades famosas na parede da sala como, por exemplo, Nelson Mandela). O intelectual mostrou sua carteira de Harvard e uma outra identidade, mas a discussão continuou uma vez que o professor se encontrava estafado devido a viagem, irritado com a invasão da polícia e gritava que o que os policiais estavam fazendo era racial profiling, ou seja, qualificar alguém como criminoso em potencial devido as suas caracterísitcas raciais.


(residência do professor em Cambridge, MA)

A discussão continuou e o policial acabou dando ordem de prisão a Gates sobre a acusação de disorderly conduct (algo como "conduta inadequada") que, segundo afirmam especialistas, é uma das leis aplicadas pela polícia nos EUA para situações onde indivíduos negros questionam sua autoridade ou conduta. Após ser anunciada a voz de prisão, Gates foi algemado e, somente depois de afirmar que não conseguia andar sem a ajuda de uma bengala, teve as algemas recolocadas com suas mãos à frente do corpo para que pudesse segurar a bengala. Detalhe: ao menos um dos policiais que atendeu ao chamado era negro.

No distrito policial, o acadêmico foi fichado e colocado numa pequena cela que, segundo suas afirmações, era extremamente claustrofóbica.

No final da estória, as acusações foram retiradas por ambas as partes, Gates e a polícia. Entretanto, o acadêmico afirmou que ainda pretende conversar com sua equipe jurídica para saber o que pode ser feito além de estar motivado a elaborar um documentário sobre racial profiling. "Os EUA possuem mais de um milhão de negros nos seus presídios e nesse dia eu me tornei mais um", afirmou o intelectual. Ok, folks, welcome to the post-racial America!

Leia uma entrevista (em inglês) com o suposto "arrombador" de residências aqui

PS: Many thanks to my good friend Gladys Mitchell for letting me know about this news!

5 comentários:

Punk Canibal disse...

Fala, Kibe Loko!
Um documentário desses ia bem no Brasil, né? Como você sabe, aqui todo negro é parado pela polícia diariamente e brancos na mesma situação (andando na rua...) não são. Eu não sou lá o cara melhor comportado do mundo, mas nunca tomei geral. Essa realidade é publicamente "ignorada". E isso só piora quando também sabemos que certos setores da polícia brasileira costumam valorizar informalmente os seus dedos leves.

Ari disse...

Pô, Kibe, a notícia saiu em toda a imprensa norte-americana, e vc num ficou sabendo. Até o Obama tá bravo com a história. Mas, indo contra a corrente, o racismo aí num me parece o mais importante, mas sim a falta de sensibilidade dos tiras (dos dois). Pois o professor afirma que também ficou nervoso... O caso era para deixar de lado, depois de ter confirmado a identidade do "suspeito" (que era obrigação dos policiais fazerem). Agora, não é uma boa gritar com policiais...armados. Já soube de casos de gente(branca) que levou porrada. Tem vídeos no You Tube mostrando.
Quanto a prisão, uma vez feita, aí toda pessoa presa tem que ser algemada (até cadávares, oq ue parece brincadeira, mas não é). O caso, então, me parece girar sobre a falta de sensibilidade de policiais (ou até o excesso de sensilibilidade) do que sobre a cor do professor. Chutando, eu diria que o "officer" se desgastou com a acusação de racismo, e para mostrar que "não era" racista, prendeu o professor.
Isso não altera em nada o que o professr Gates disse na entrevista, obviamente. Mas, é aquela coisa, no caso dele (e se fosse um outro professor famoso seria o mesmo) todo mundo se mexeu, o caso ganhou as manchetes (desatentos, claro, não souberam da coisa). Mas e se fosse um preto pobre numa área pobre? Estaria na cadeia até hoje...

Flavio disse...

Gates em dia de Thug! Bom material para as piadas de Chris Rock. Post-Racial America is not coming yet!

Raphael Neves disse...

Dêem uma olhada neste texto aqui sobre racial profiling da ACLU

http://blog.aclu.org/2009/07/23/racial-profiling-%E2%80%9Cthats-just-a-fact%E2%80%9D/

Abraços,
Rapha

Márcio Macedo disse...

Prezados,

Obrigado pela leitura e comentários. Infelizmente tenho andado meio sem tempo para comentar todas as observações de forma mais detalhada.

Tendo a concordar com o Ari no que diz respeito a falta de sensibilidade de ambas as partes e o questionamento da autoridade do pessoal por parte do professor. Anyway, de forma nenhuma um caso desses iria passar sem levantar a discussão sobre o estado atual das relações entre negros e brancos nos EUA atual.

Rapha, valeu pelo link! Vou olhar com calma mais tarde.

Guilhermão, o caso do Brasil é similar aos EUA. Você se lembra do dentista que foi morto pela PM de São Paulo anos atrás quando levava sua namorada européia ao aeroporto?

Flávio, Rock vai deitar e rolar com esse caso, tenha certeza!

Abraço a todos,

Márcio/Kibe.