domingo, 4 de dezembro de 2011

Direitos Humanos e Desenvolvimento


quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Vai Samba Aí?

Fique esperto/a com as datas: o Dia Nacional do Samba é na sexta-feira, 2 de dezembro, mas o show ocorrerá no sabadão, 3 de dezembro.  Maiores informações clique AQUI

Muita Paz, Muito Amor!


terça-feira, 29 de novembro de 2011

Literatura e Afrodescendência no Brasil


segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A Arte e a Rua



Madrugada de segunda e eu com preguiça de escrever. Mesmo assim passei por aqui para deixar o toque da estréia do documentário A Arte e a Rua que retrata a transformação sofrida pelos elementos do hip-hop  no bairro de Cidade Tiradentes, São Paulo.  O filme foi dirigido por Carolina Caffé e Rose Satiko Hikiji, professora do departamento de antropologia da Universidade de São Paulo (USP) e tem seu pré-lançamento marcado para o dia 7/12, às 20h, no Matilha Cultural (rua Rêgo Freitas, 542, Centro), em São Paulo. Assista o trailer logo abaixo.

Muita Paz!

 

domingo, 20 de novembro de 2011

20 de Novembriz!

Café preto Wallpaper Download

"Um café preto, por favor: é 20 de novembro."

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Barack Obama: Desapontamento ou Ainda Esperança?


A corrida eleitoral para a presidência norte-americana já começou. Barack Obama, nas últimas semanas, saiu numa viagem por vários estados do país (principalmente os chamados "swing states", ou seja, aqueles que não tem uma posição definida se são tradicionalmente democratas ou republicados) tentando reconquistar a confiança de seu eleitorado e daqueles que, mesmo não sendo democratas abertamente, depositaram sua confiança nele em 2008. No lado republicano há um frenesi sobre quem será o pré-candidato que conseguirá ser indicado nas primárias que devem acontecer no início do ano. A grande novidade é Herman Cain: um self-made man negro que nas duas últimas semanas vem enfrentando acusações de ter cometido assédio sexual contra subordinadas e ex-funcionárias. Mas deixando de lado as encrencas de Cain e voltando ao atual comand in chief fica a pergunta: Obama tem sido um bom presidente?  Há avanços e problemas. O principal problema é que a economia norte-americana ainda "patina" com uma taxa de desemprego alta que afeta principalmente os mais pobres e com pouca qualificação profissional e determinados setores da classe média. Há pessoas que se declaram abertamente desapontadas com Obama, como o filósofo afro-americano Cornel West e o Nobel de economia Paul Krugman (ambos professores em Princeton).  No vídeo abaixo Jake Lamar (foto acima), um escritor afro-americano residente em Paris, diz que não se encontra desapontado com Barack Obama e expõe os seus argumentos para isso. Vale a pena assistir. E você, está ou não desapontado com Obama?

Muita Paz e Ótimo Feriado e Semana!

domingo, 13 de novembro de 2011

VIII Marcha da Consciência Negra

Eu vou. E você?...

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Niver, USP, Coisas...

Meio sem saco pra escrever. Especialmente depois de ter bebido uma garrafa de vinho. Sim, foi meu aniversário e meus amigos reclamaram porque não podiam deixar mensagens no meu mural no Facebook. Eu nem lembrava disso e muito menos o porquê de ter restringido a postagem de mensagens no meu mural. Provavelmente isso ocorreu em alguma crise de chatice minha ou devido a algum/a mala que começou a postar coisas que me desagradavam. Enfim, hoje/ontem foi meu niver. Nada demais. Depois de certa idade não se faz grandes festejos e alardes. Enquanto caminhava do supermercado (onde fui comprar um vinho) de volta para a casa de meus pais, lembrava dos meus últimos aniversários. Em 2008 meu aniversário foi num sábado e minha namorada à época me levou para jantar num restaurante caribenho. Em 2009 meu aniversário foi numa quarta e reuni meus amigos no meu restaurante jamaicano preferido em NYC para comer. Em 2010 meu niver foi numa segunda e eu estava em Boston para visitar amigos que estudam em Harvard e um date. 2011... Well, nada demais. Limeira, ouvindo Bob Dylan, Ramones, John Coltrane, Beatles e Santogold enquanto bebo um vinho português e fuço na web vendo as notícias sobre a USP e respondendo salves de amig@s.  A parte boa é que acabei me presenteando com 12 livros que sairam absolutamente por um pechincha considerando os títulos. Estou especialmente animado com três deles: Homem Comum de Philip Roth; O Fantasma do Rei Leopoldo de Adam Hochschild e Malagueta, Perus e Bacanaço de João Antonio (na linda edição da Cosaf Naify). Obrigado a todo/as que me enviaram felicitações pelo Facebook e email. Com certeza vou demorar alguns dias para responder a todo/as, mas com certeza o farei. É isso, só mais um ano. Nada mais.

Muita Paz!

terça-feira, 8 de novembro de 2011

A Sociologia de Jay-Z

Tradução do texto Hoyas and Hova — Georgetown sociology course focuses on rap star Jay-Z publicado em 2 de novembro de 2011 no jornal The Washington Post por Chris Richards.

 
 
É segunda de manhã na Universidade Georgetown (Washington DC) e Michael Eric Dyson está na página 176 de Decoded, o livro de memórias da super estrela do rap Jay-Z.

Andando pela classe no seu terno quadrado azul royal, o professor de sociologia empurra seus óculos acima do nariz e mergulha numa passagem que é uma meditação do rapper sobre raça e auto-imagem: "Jay-Z está falando sobre a concepção imagética da negritude que é evocada em um mundo branco pensando sobre cultura negra." Estudantes, abarrotados na sala de aula, tomam nota desta idéia em seus cadernos espirais e outros a digitam em seus laptops. Essa é uma das incontáveis afirmações que joram da mente do professor durante o que tem se tornado um dos cursos mais populares do campus - SOCI-124-01 ou Sociologia do Hip-Hop - Teodicéia Urbana de Jay-Z. Talvez seja o único curso da Georgetown que possa ser discutido na MTV.

A super estrela do rap, que escapou de uma juventude pobre no Marcy Projects, Brooklyn, e ascendeu a linha de frente da consciência pop americana, está sendo agora examinado nas torres de marfim da academia. Todos o conhecem como Hova. Shawn Carter. O marido de Beyoncé. O cara de 41 anos que borrou a linha separadora entre artista e empreendedor e ajudou a cultura sobre a qual eles cresceram. Mas Dyson está pedindo a seus alunos que pensem maior: "Qual é o predicado intelectual, teológico e filosófico para o argumento de Jay-Z?"

Jay-Z estará no Verizon Center na quinta-feira para um show com Kanye West e lá também estarão um punhado de alunos de Dyson. Mas apenas ser um fã não se traduz numa aprovação imediata no curso. "Esta não é uma classe do tipo sentar na cadeira e lançar um 'Cara, essas rimas são foda!', diz Dyson, um autor formado em Princeton, apresentador de rádio sindicalizado e ministro batista ordenado. "Nós estamos lidando com tudo que é importante em uma classe de sociologia: raça, gênero, etnicidade, classe, desigualdade econômica, injustiça social... O corpo do seu trabalho provou ser poderoso, efetivo e influente. E é tempo de lidar com ele."

Em suas aulas, Dyson defende a idéia da gravidade inadvertidamente política da música rap. "O hip-hop globalizou uma concepção de negritude que tem tido um impacto político, independente do fato de se existia ou não um intento político," diz ele exaltado.

Ele desenvolve paralelos entre os escritos do pioneiro dos movimentos pelos direitos civis W.E.B. Du Bois e as rimas da 'lenda do rap dos anos 90, Notorious B.I.G. Ele examina a adolescência de trambiqueiro de rua de Jay-Z como um pequeno exemplo das dinâmicas do capitalismo tardio que o sociólogo Max Weber descreveu em seu trabalho de 1905, A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Ele examina como as lutas de classe da América do século vinte e um promoveram a ascensão dos protestos Ocupe Wall Street - tudo tendo como pano de fundo a ascensão do rapper que foi do fundo dos noventa e nove por cento ao topo do um por cento (referência a uma das afirmações do movimento Ocupe Wall Street de que a elite econômica constituída de um por cento da população norte-americana concentra oitenta por cento da riqueza em detrimento dos noventa e nove restantes que dividem apenas vinte por cento da riqueza).

Tudo isso é típico do que tem acontecido na sala de aula de Dyson às segundas e quartas de manhã deste semestre - um auditório cheio de idéias e corpos. 

Quando as oitenta vagas do curso foram preenchidas na primeira semana de matrículas do semestre, Dyson o realocou para uma sala maior que pudesse acomodar cento e quarenta estudantes. Esta é a contagem oficial, de qualquer modo.

"Eu não tinha espaço no meu horário para fazer essa aula," diz a aluna de última ano Jackie Steves, que tem assistido as aulas como penetra, com a permissão de Dyson. "Mas eu venho sempre que eu posso." Depois da aula, ela aglomera a frente da sala de aula junto de uma dezena de outros alunos que ajudam a compor uma das mais diversificadas reuniões em Georgetown, uma universidade onde as minorias são vinte e um por cento do corpo discente da graduação.

"Apenas o fato dessa classe existir já mostra que há opções não ortodoxas nas universidades mais tradicionais e estruturas sociais da América," diz Tate Tucker, um estudante de segundo ano também esperando para falar com o professor. "Então, com muita esperança eu estarei preparado para forgar meu próprio caminho, muito da mesma forma que ele fez."

Tucker não está falando sobre Jay-Z. Ele está falando de Dyson que tem sido uma estrela no campus desde sua chegada em 2007. "O boca a boca sobre os cursos de Michael é enorme," diz Timothy Wickham-Crowley, chefe do departamento de sociologia da Georgetown. Wickham-Crowley afirma que este estudo do trabalho de Jay-Z é valioso de uma perspectiva sociológica porque ele ressoa com um larga porção de humanidade e gera discussão. "Quando [Dyson] sai da sala de aula, ele traz os alunos a reboque e há essas discussões animadas, conversas engajadas acontecendo," ele diz. 

O curso sobre Jay-Z da Georgetown tem também gerado conversas entre estudantes e os pais que assinam os cheques das suas mensalidades - US$ 40,920 pelo ano acadêmico 2011-2012. Ryan Zimmerman, um último anista se formando em governança e sociologia, diz que a sua família não estava tão excitada quando ele se matriculou. "Hip-hop não existia quando meus pais estavam crescendo com Billy Joel, Van Morrison e os Rolling Stones," diz Zimmerman. "Meu pai agiu tipo,  'Com licença, filho? O que?'"

Dyson entende. "Eu estou certo que há um certo puxa-empurra de alguns pais de estudantes," ele diz. "Mas eu digo a eles, 'Tragam seus pais aqui. Deixe-os ver o que nós estamos fazendo. Isso pode mudar a mente deles.' " Esta é a especialidade de Dyson -  buscar lacunas geracionais em busca de pontes. Ele é um desavergonhado auto-promotor que aparece regularmente em canais de notícias, rádios públicas e programas como Real Time With Bill Maher (Em Tempo Real Com Bill Maher). Parte da sua contínua missão tem sido fazer a bagunçada diplomacia entre a geração hip-hop e sua frequentemente desdenhosa geração mais velha.

"Eu sou um ala [posição intermediária no basquete], cara! Eu não pude marchar com o Doutor King e seus comparsas. E eu sou muito velho para ser um hip-hopper," diz o professor de 53 anos durante seu horário de atendimento extra classe. "Mas eu ganhei um status honorário em cada geração... Eu vejo a minha língua como uma ponte sobre a qual ideias podem viajar de um lado para o outro."

Dyson ofereceu sua primeira classe sobre hip-hop em nível universitário em 1995 na Universidade da Carolina do Norte. Desde então ele tem ensinou em Columbia, DePaul e na Universidade da Pennsylvania, onde ele ofereceu uma classe sobre Tupac usando o seu livro de 2002, Holler if You Hear Me: Searching for Tupac Shakur (Passe Adiante Se Você Me Ouvir: Em Busca de Tupac Shakur).
 
Em anos recentes, a Boston University ensinou sobre Bob Dylan e a New York University sobre Beatles, mas cursos de faculdade sobre rappers são raros. Cursos sobre rappers contemporâneos são praticamente inexistentes.

Dyson vê o seu curso como outro passo em diração a validar o hip-hop para uma geração mais velha que frequentemente desdenha da música por sua violência e misoginia. "Isto não significa que eles não tenham críticas legítimas," Dyson diz. "Mas a forma de arte em si não pode ser descartada."

Para fortalecer essa mensagem em Georgetown, ele pontilhou seu programa com professores convidados, incluindo acadêmicos como Mark Anthony Neal e James Peterson, e Zack O'Malley Greenburg, escritor do staff da revista Forbes cujo livro Empire State of Mind: How Jay-Z Went from Street Corner to Corner Office está também na lista de leituras do curso. Textos sociológicos tradicionais não estão listados, mas Dyson espera que os alunos façam referência aos teóricos que ele cita durante as aulas nos seus trabalhos e provas. 

E Dyson está ainda tentando trazer uma aparição ainda maior na sua sala de aula: Jay-Z em pessoa. Ele é amigo do rapper e o tem cortejado a vir ao campus, frequentemente enviando raps a ele via mensagens de texto. "Eu mando algumas rimas pra ele via texto," Dyson diz. "Vê como eu sou doido?"

Na segunda, Jay-Z respondeu a sua mensagem: "Tenho ouvido ótimas coisas sobre a aula! Obrigado e se mantenha representando a poesia! Respeito, J." (O rapper se recusou a ser entrevistado para este artigo.) "Seria uma honra e um golpe," Dyson diz da visita em potencial. "Ele sabe o que está acontecendo." E os estudantes sabem que ele sabe. Dyson gosta de gabar-se de sua amizade com famosos em classe referindo-se a recentes conversas que teve com o cantor de R&B Trey Songz e o Reverendo Jesse Jackson - tema de um pequeno seminário que Dyson está também ensinando em Georgetown esse semestre. (Jackson visitou a turma.)

A única aparição na aula de segunda foi Omekongo Dibinga, o assistente de ensino de Dyson que também é DJ de iPod na aula. Ele solta Minority Report, um dolorido canto fúnebre de 2006 que Dyson descreve como "uma das mais pungentes e poderosas canções sobre o Furação Katrina."

Lamentando a impotência dos pobres e perscrutando fundo na própria consciência do rapper, ela é uma das mais duras críticas de Jay-Z ao sistema - e a si mesmo.

"Sure, I ponied up a mill, but I didn't give my time (Claro, eu contribui com um milhão, mas eu não dei meu tempo)/ So in reality, I didn't give a dime, or a damn (Então, na real, eu não dei sequer 10 centavos, or qualquer  droga)/ I just put my monies in the hands, of the same people that left my people stranded (Eu apenas coloquei o meu dinheiro nas mãos, das mesmas pessoas que deixaram meu povo encalhado)"
 
Cabeças balançam sobre o sensível efeito da batida da música. Lábios silenciosamente se movem acompanhando a letra. Mesmo os estudantes sentados imóveis em suas cadeiras estão ouvindo cuidadosamente, tentando aprender o que um garoto negro dos conjuntos habitacionais de Marcy, Brooklyn, pode nos ensinar sobre a América e nós mesmos.

Para assistir uma vídeo/entrevista com Michael Eric Dyson, clique AQUI

domingo, 6 de novembro de 2011

Reitoria X Estudantes X PM X Sociedade = USP


O conflito que se instauro no campus da Universidade de São Paulo (USP) desde semana passada novamente catalizou discussões a respeito da universidade e do seu papel/função na sociedade. Infelizmente,  devido a forma como o conflito entre alunos e a Polícia Militar (PM) explodiu e a maneira extremamente ruim e equivocada com que a impressa o vem cobrindo tem apenas contribuido para que velhos estereótipos e afirmações baseadas no senso comum prevaleçam sobre a universidade e seu corpo discente. Resumidamente, a mídia promove o grupo de estudantes que reinvidicam a saída da PM do campus como uma minoria que se utiliza de um argumento pretenciosamente político para preservar privilégios - uso de drogas - no interior do campus da universidade.  Isso é uma inverdade. A imagem acima exemplifica um pouco a complexidade do problema. Nessa foto publicada no jornal Folha de São Paulo dias atrás um aluno participando de uma manifestação contrária ao grupo que exige a saída da PM do campus exibe um cartaz ironizando o grupo que invadiu a administração da faculdade de filosofia. O conflito deu vazão a uma série de problemas que a comunidade uspiana tem que discutir, mas que por uma série de motivos não o faz há anos. São eles: 1) estrutura de poder e democracia na universidade; 2) política de isolamento da universidade tomada pela reitoria da USP em relação a seu campus na cidade de São Paulo nos últimos 15 anos; 3) segurança do campus e formas de resolver problemas como roubos, latrocínios, assaltos, homicídios e estupros que acontecem cotidianamente na Cidade Universitária e, finalmente, 4) uma discussão séria e aberta sobre o uso de drogas no campus. Das coisas que li pela internet nos últimos dias, o melhor texto é de autoria de Raquel Rolnik, professora da FAU/USP (leia AQUI ).
 
José de Souza Martins, professor titular aposentado do departamento de sociologia da USP, publicou o artigo "Destinatário Desconhecido" no jornal O Estado de São Paulo desse domingo, 6 de novembro (leia AQUI ). Regorgitando autores clássicos da sociologia que trataram do tema da juventude e listando revoluções que ocorreram no decorrer da história mundial Martins, num sociologuês charmoso, acusa o movimento de estudantes da USP de não ter um objetivo ou alvo mais concreto. Ele termina o artigo afirmando que: "Mas, como agora aqui na USP, os jovens não sabiam o endereço do destinatário da revolta e do sonho pela simples razão de que o destinatário é difuso, está em todos os lugares, até mesmo e sobretudo no cenário bucólico e poluído do fumacê ao lado do prédio de História e Geografia, onde o sonho é cotidianamente comercializado por traficantes e mercenários." Ou seja, uma versão mais sofisticada e com a "carteirada" uspiana, mas que apenas reproduz o argumento da grande mídia: são jovens ingênuos e sem causa perdidos em conflitos geracionais que não sabem o que fazem. Será? Tenho minhas dúvidas!
Muita Paz!

sábado, 5 de novembro de 2011

A História do "Lover's Rock"

 
Sábadão de preguiça total e calorzinho mediano. Como estou na casa de mamãe e papai no interior de São Paulo vou ler um livrinho básico, mas se estivesse em Londres iria tentar assistir o documentário The Story of Lover's Rock  que descreve o surgimento e desenvolvimento desse estilo de reggae de características românticas surgido na Inglaterra dos anos 1970. No filme há entrevistas com os artistas Denis Bovell, UB40, Levi Roots Linton Kwesi Johnson, Angie La Mar, Maxi Priest, Mykaell Riley dentre outros. Fica a dica. Veja o trailer da parada logo abaixo.



Muita Paz!

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Filme de Negrão em Destaque: Mostra de Blaxploitation em SP e RJ

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/d/d0/Shaftposter.jpg
"Filme de Negrão" é uma expressão que eu e meus amigos usávamos nos anos 1990 e parte dos 2000 para se referir a películas focadas na experiência dos negros afro-americanos. O primeiro "filme de negrão" que assisti foi Do The Right Thing (1989) de Spike Lee que foi seguido por New Jack City (1991) de Mario Van Peebles e Boys n the Hood (1991) de John Singleton. A lista foi crescendo com o passar dos anos e envolvia desde os bangue bangues sanguinolentos urbanos da dupla de diretores The Hughes Brothers exemplificados em Menace II Society (1993) e Dead Presidents (1995) chegando até as comédias românticas pretas na pegada de The Best Man (1999) de Malcolm D. Lee.  O que eu e meus amigos não sabíamos à época é que todos esses filmes, e seus respectivos diretores, foram influenciados por uma tradição de cinema negro do final dos anos 1960 e parte dos 1970: o blaxploitation.  Entre 1 e 24 de novembro ocorrerá no Rio de Janeiro e em São Paulo a mostra de filmes Tela Negra: O Cinema do Blaxploitation (consulte a programação AQUI). É uma oportunidade única de assistir filmes históricos na telona.



Blaxploitation são filmes norte-americanos de “produção B”, ou seja, realizados com poucos recursos, e que exploram temáticas e atores negros em suas tramas e enredos. O termo blaxploitation é uma junção das palavras black (negro) e exploitation (exploração) tendo sido criada no começo dos anos 1970 por Junius Griffin: publicitário e diretor da Associação Para Avanço dos Homens de Cor (NAACP) de Los Angeles. A película que deu origem ao movimento foi o filme manifesto de Melvin Van Peebles, Sweet Sweetback’s Baadasssss Song (1971), sendo, posteriormente, seguido por outras películas que já tinham um apelo mais comercial. Uma boa explicação do que consistem esses filmes e do porquê deles terem sido tão populares a sua época pode ser captada ao descrevermos o filme de Peebles, considerado como a película mais política e responsável por lançar os marcos fundantes de uma estética utilizada até a exaustão (clique sobre os links para ver os trailers dos filmes citados abaixo).
 
Sweet Sweetback's Baadasssss Song foi produzido com recursos do próprio diretor e outra parte (US$ 50 mil) emprestada do ator Bill Cosby já deveras famoso à época. Peebles utilizou atores que receberam quase nada para atuarem e a edição/montagem foi realizada pelo próprio diretor que quase ficou cego no processo. Peebles ainda atuou como personagem principal e enfrentou barreiras burocráticas para lançar o filme que foi classificado na mesma categoria de filmes pornográficos devido as cenas de sexo e conteúdo polêmico o que, junto com outras questões, fez com que a maior parte dos cinemas se recusassem a exibí-lo. Mesmo assim o longa de Peebles estourou fazendo a maior bilheteria de um filme independente nos EUA naquele período e lucrando em torno de US$ 10 milhões. Isso se deu em muito devido a aprovação do conteúdo da película pelos Black Panthers Party que o viram como uma espécie de resumo da sua ideologia.

O filme conta a história de um cafetão negro perseguido pela polícia após matar, com as próprias algemas, dois policiais que espancavam um jovem negro na sua presença. A história é repleta de uma iconografia entendida como subversiva e transgressora à época, pois negros são vistos em papéis que exageram estereótipos aos quais estavam submetidos, exemplo disso pode ser visto na forma como a sexualidade é retratada no filme. Ao mesmo tempo, o filme coloca no centro da trama um negro que atua desafiadoramente na tela agredindo policiais brancos e fazendo sexo com mulheres brancas. Sweet foi o filme que forjou a fórmula utilizada pelos filmes blaxploitation mais comerciais dos anos 1970 como Shaft (1971), Super Fly (1972) Cleopatra Jones (1973), Foxy Brown (1974) dentre outros. Em todos esses filmes os personagens principais são espécies de heroínos negros nada ortodoxos que usam e abusam de violência, virilidade, malandragem, técnicas de caratê e capacidade de sedução para chegar aos seus objetivos.
 
Outro aspecto digno de nota diz respeito as trilhas sonoras dos filmes. Produzidos num momento de ascensão dos ritmos soul e funk determinadas canções se tornariam tão ou mais famosas do que os filmes para os quais foram criadas. Esse é o caso do tema de abertura de Shaft,  escrita e interpretada por Isaac Hayes (ouça AQUI), assim como o mesmo ocorreu com a trilha sonora de Superfly, que levou a assinatura de Curtis Mayfield (ouça AQUI). A propósito, o diretor dos dois filmes citados é Gordon Parks, famoso fotográfo afro-americano que nos anos 1960 ao visitar o Brasil a trabalho para a Life Magazine acabou se envolvendo numa polêmica devido ao teor das fotos tiradas por aqui e publicadas na revista norte-americana (leia mais AQUI).

Os quinze filmes que compõem a mostra fornecem um bom panorama do que foi o movimento. Entretanto, faltou um olhar mais focado no sentido de entender qual é a contribuição do blaxploitation para a indústria do cinema, em geral, e o cinema negro, em específico. É esperado que os debates programados para acontecer cumpram esse papel ao trazer diretores de cinema e outros especialistas no assunto. Porém, a exibição de alguns filmes poderiam suprir essa lacuna. Esse  o caso do documentário Baadasssss Cinema - A Bold Look At 70's Blaxpoitation Films dirigido pelo inglês Isaac Julien em 2003. Julien entrevista as principais estrelas que atuaram em filmes blaxploitation e evidencia como o gênero foi responsável por influenciar a obra de um dos mais importante diretores norte-americanos contemporâneos: Quentin Tarantino. Em sua entrevista Tarantino diz ter sido um grande fã dos filmes a ponto de ter tido a idéia de realizar um remake de Foxy Brown, Jackie Brown, filmado em 1997 e que contou com a participação da atriz Pam Grier numa parceria incrível com Samuel L. Jackson.
 http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/1/1d/Wattstax_poster_1973.jpg
Outra faceta que fica faltando a mostra são os filmes blaxploitation que fazem paródias escrachadas de gêneros clássicos do cinema americano como o filme de "terror" Blacula (1972) e o bangue bangue Boss Niger (1975). Algo que também nunca tivemos a chance de ver aqui no Brasil é Dolemite (1975): uma espécie de Charles Bronson negrão pra lá de engraçado. Dolemite é um cafetão (pimp) negro barra pesada lutador de kung fu interpretado pelo comediante Rudy Ray Moore (1927-2008). O sucesso do primeiro filme rendeu várias outras continuações que se extenderam até 1982 num total de quatro.  Recentemente, uma comédia intitulada Black Dynamite (2008) foi produzida nos EUA tendo como inspiração os filmes de Moore e seu personagem clássico Dolemite. Penitentiary (1979) de Jamaa Fanaka e Baadasssss! (2003) de Mario Van Peebles, que conta a história da produção do filme de seu pai, Sweet..., também seriam bem-vindos a mostra.

Por fim, rola uma certa forçação de barra da produção da mostra ao enquadrar o documentário Wattstax (1973) como um blaxploitation. O filme tem valor inestimável para entender os vínculos entre música e ativismo nos EUA dos anos 1960, contudo, ele não se enquadra de forma alguma numa estética e proposta blaxploitation. O título Wattstax é uma brincadeira juntando os nomes do bairro de Los Angeles Watts com Stax, legendária gravadora de soul norte-americana. Em 1972 foi realizado o Wattstax Music Festival no Los Angeles Coliseum reunindo artistas da gravadora para uma apresentação que ficaria conhecida como a Black Woodstock e que celebrava o sétimo aniversário dos riots (revoltas) ocorridos em Watts em 1965. O filme intercala os shows realizados com a fala de moradores do bairro sobre racismo, violência policial e perspectivas de vida. O ponto alto do filme é a condução do mesmo pelas piadas de Richard Pryor, o primeiro comediante negro a incluir ácidas críticas sociais ao racismo e relação entre negros e brancos nas suas piadas (boa aulinha para os amadores da comédia stand up brasileira), antecipando o estilo em que Chris Rock faz tanto sucesso hoje.

Mesmo considerando essas omissões e escorregões, a mostra é imperdível. As imagens exibidas acima são de Richard Roundtree, Melvin Van Peebles, a fabulosa Tamara Dobson, Ron O'Neal, a linda Pam Grier, cartaz de divulgação do filme Wattstax e, por fim, Rudy Ray Moore.

Muita Paz!

PS: agradeço a meu truta Vandão por me avisar da mostra e sugerir o post!

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Ser Pret@ em Novembro É...


1- Ser convidado por dez universidades, vinte e cinco colégios privados e quarenta escolas públicas para  falar da sua experiência de ter sido vítima de discriminação racial. O que é muito comum acontecer também é que, mesmo você dizendo que é um engenheiro preto e católico, continuem insistindo para que você seja a presença principal numa mesa sobre candomblé na Bahia no século XIX, pois o historiador que iria teve que cancelar na última hora.

2- É mês de aumentar as suas milhagens aéreas participando de mais eventos do que shows feitos pela rapaziada do Fundo de Quintal.

3- É mês que todo mundo abre um sorrissinho amarelo pra você na padaria, no boteco, no supermercado e até os seguranças do shopping resolvem não pegar tanto no seu pé. "E aí negrão?! Firmeza total?", diz o guardinha do estacionamento.

4- É o mês que todos seus trutas - brancos e pretos - colam no seu apartamento querendo assistir só "filme de negrão" e uns DVDs que você mantêm guardado bem lá no fundo da sua videoteca. Coisas como Raízes, Biko, Amistad, Quilombo, Chica da Silva e, obviamente, todos as películas do Spike Lee (são quase 40... Urgh!) a começar por Malcolm X. Anos atrás tive que cancelar um sessão de última hora já que um dos meus amigos apareceu lá em casa com um sorrisso de escárnio no rosto querendo assistir um filme que achava ótimo para a ocasião: O Nascimento de uma Nação!

5- É o mês que todas aquelas velhas discussões que você evita tanto surgem logo que você se senta na mesa do boteco às 18 horas da sexta-feira: "Porra, Juvenal, por que negrão só gosta de loira, hein?", "Juvenal, mas diz pra nóis como foi pra você chegar até aqui: lutou muito negrão?", "Juvenal, mas você não acha que esse negócio de cotas é racismo ao contrário? Porra, todo mundo é igual, cara! Tem que ter as mesmas oportunidades!", "O Juvenal, porque a maioria dos craques de futebol são pretos?", "Juvenal, eu gosto de samba, mas samba samba, não essa merda de pagode, tá ligado?", "Juvenal, vou falar um negócio pra você, mas não conta pra ninguém: no fundo fundo eu sou é chegado numa negona, sabe? É...", "Juvenal... Juvenal... Juvenal..." Enquanto você fala e/ou escuta, sua cerveja - loira ou preta - esquenta!

6- É o mês que todo mundo reclama que o Brasil tem feriados em excesso e que esse último aí, que querem estipular no tal do 20 de novembro, não tem muito sentido de existir!

7- É a época mais difícil para se arrumar um/a namorado/a preto/a (seja você preto ou branco). Nessa época a negraiada é uma mercadoria super escassa, pois todo mundo quer um/a PRETINHO/A para ir aos eventos, tirar uma foto ao seu lado e parecer descolado/a. As chances de ser dar entrevista para a TV aumentando muito. Se você fizer o tipo "preto/a descolado/a hipster moderno/a retrô MTV" então vai ter gente saindo no tapa pra marcar um cineminha contigo! 

8- É o mês que os donos de livraria ficam super contentes por que todos os livros sobre candomblé, umbanda, África, relacões raciais, samba e as biografias de Obama e Nelson Mandela vendem rapidinho! 

9- É o mês que você vai na sua passeatinha na Paulista e fica com invejinha da comunidade GLBTS e dos evangélicos!

10- É o mês que você, surpreendentemente, descobre assistindo a TV que você e sua nega véia ganham menos do que a família branca que é sua vizinha, que a polícia te para constantemente na rua por conta do seu carro, que a maior parte dos pobres no Brasil é constituída por pretos e outras coisinhas menores que você não tinha a mínima idéia de que ocorriam. 

Mas é divertido ser PRETO/A em novembro. É tão divertido que minha mãe resolveu dar a luz a mim nesse mês. Eis aí, Márcio Macedo: Preto, Curinthiano e Escorpiano! 

Muita Paz e que Venha Mais um Novembro!

domingo, 30 de outubro de 2011

Michael Muhammad Knight: Hip-Hop, Nação do Islã e os Five Percent.

Tradução do artigo Convert Straddles Worlds of Islam and Hip-Hop publicado no jornal New York Times no último sábado, 29 de outubro de 2011.

Convert Straddles Worlds of Islam and Hip-Hop
Mark Oppenheimer



Ele era um "garoto branco de 15 anos de idade com um pai diagnosticado com esquizofrenia, estuprador e separatista racial e mãe enfrentando seu segundo divórcio,"Michael Muhammad Knight escreve em suas mémorias de 2006, "Blue Eyed Devil: A Road Odyssey Through Islamic America." (Diabo dos Olhos Azuis: Uma Estrada de Odisséia Através da América Islâmica). Em sua casa em Rochester, ele "ouvia muito Public Enemy e lia 'A Autobiografia de Malcolm X' e aos 16 anos tinha um enorme poster do Ayatollah Khomeini na parede do seu quarto. Aos 17, Knight, tendo se convertido ao Islão, estava "circulando no interior do Paquistão com refugiados afegãos e somalis" e estudando "na maior mesquita do mundo: Faisal Masjid em Islamabad, que se parecia a uma nave espacial."




Isto foi precisamente metade de um tempo de vida passado. Knight, agora com 34 anos, é um estudante de doutorado em estudos islâmicos na Universidade da Carolina do Norte. Ele retornou para os Estados Unidos no mesmo ano que saiu e aos 20 anos trocou seu fundamentalismo islâmico por versão mais liberal e irreverente. Escritor prolífico, ele frequentemente satiriza seus camaradas islâmicos, cutucando os tradicionalistas. Ele é um bobo da corte para o mundo islâmico, um provocador em um kufi (adorno de cabeça usado pelos muçulamos).

Knight escreveu sete livros desde 2002, incluindo um de memórias no qual ele descreve sua desilusão com o Islão ortodoxo, um romance, "The Taqwacores," sobre um fictício submundo de roqueiros punks muçulmanos, e outro, "Osama Van Halen" (2009), sobre punks que sequestram Matt Damon e exigem papéis mais favoráveis de muçulmanos em filmes. Seus escritos têm perturbado muitos muçulmanos, assim como seus ataques a hiprocrisia e rebeldia no mundo islâmico. Até agora ele é reconhecido como um praticante (e danoso) aprendiz do islamismo sunita, a maior tradição muçulmana do mundo. Mas Knight encontrou uma nova maneira de surpreender seus camaradas fiéis. No seu sétimo livro, "Why I Am a Five Percent" ("Porque Eu Sou Um Cinco Por Cento") - Jeremy P. Tarcher/Penguim, publicado este mês - Knight professa sua afinidade com a Nação dos Deuses e Terras, também conhecido os Five Percent, um rebento misterioso e mal entendido da Nação do Islã.

 
Em 2007, Knight publicou uma história dos Five Percent, os quais estavam organizados no Harlem em 1964. Eles tomaram o nome do ensinamento da Nação do Islã de que 5 por cento das pessoas são "pobres professores por direito" que devem educar as massas oprimidas. Em "The Five Percents: Islam, Hip-Hop and the Gods of New York," (Os Cinco Por Cento: Islão, Hip-Hop e os Deuses de Nova York), Knight argumenta que a reputação de criminalidade do grupo foi largamente exagerada.

No entanto, muçulmanos ortodoxos se resentem da conexão existente na mente de algumas pessoas entre o Islão tradicional e os Five Percent cuja teologia eles consideram heresia. E os Five Percent não proferem mais qualquer conexão com o Islão tradicional.

 
Ainda, o que interessa não muçulmanos não é a precisão teológica mas o fascínio único dos Five Percent. O dialeto do secto, sua obscura numerologia e excêntrica formulação de orgulho racial - na qual homens negros são considerados "deuses" (gods), mulheres negras "terras" (earths) - tem largamente influenciado a música hip-hop e, consequentemente, algo para além da América negra.  

Em seu livro anterior sobre o grupo, Knight reafirmava a profunda história dos Five Percent voltando ao seu fundador, Clarence 13X Smith, que se auto-denominava Allah. Ele também analizou mensagens dos Five Percent nas letras de artistas como Wu-Tang Clan, Busta Rhymes e 50 Cent (o qual pegou seu nome de outro 50 Cent, um trambiqueiro [hustler] de rua pertencente aos Five Percent e assassinado em 1987).

Para milhões de fãs de rap se questionado sobre aquelas letras bizarras do rapper RZA (foto acima) do Wu-Tang Clan, ou refletindo sobre as origens da afirmação de rua "Word" (palavra), ou mesmo se perguntando do porquê Erykah Badu (foto abaixo) ter nomeado seu filho Seven (sete), aqui estão no mínimo algumas respostas.

(Para os não iniciados, Seven (sete) refere-se a Deus.

 
Mas ao oferecer sua simpática exploração dos Five Percent, Knight nunca sugeriu que ele era um deles. Ele se colocava como um muçulmano sunita estudando um grupo desconhecido. No novo livro, no entanto, as coisas mudaram

Knight escreve agora que sua imersão no mundo dos Five Percent fez dele, de certa forma, uma pessoa de dentro. Ele não aceita a verdade literal de todas as suas afirmações (e ele é cético de que todos os Five Percent o fazem também). Mas ele não é mais um estranho ao grupo buscando se inserir.

"Enquanto meu encontro com os Five Percent influenciou meu pensamento sobre raça e religião," Knight escreve, "algo mais aconteceu, algo mais profundo do que posições intelectuais." Ele se viu contemplando essas questões "em termos dos Five Percent, usando linguagem dos Five Percent." "Tornou-se completamente natural para mim refletir sobre a data do dia usando Matemática Suprema," o sistema dos Five Percent no qual números representam conceitos espirituais (um é conhecimento, dois é sabedoria e assim por diante). Algumas vezes Knight "experimentou até mesmo uma ressonância emocional mais profunda com narrativas do ex Clarence 13X e seus deuses adolescentes do que aquelas do Profeta Muhammad e seus companheiros."

Knight não vive como um Five Percent. Alguns diriam que ele nem mesmo vive como um muçulmano. Nos seus dois anos em Harvard, onde em maio terminou um mestrado, "foi a mesquita talvez duas vezes," contou-me ele essa semana. Mas essa aparente tensão somente aponta para o principal argumento de "Why I Am a Five Percent"; esta identidade religiosa não é necessariamente sobre fé, ou mesmo sobre cultura. Acadêmicos gastam uma porção de tempo rebatendo a bolinha de tênis sobre o que "religião" é; para Knight, ela é uma forma de ver o mundo. Ele chegou ao Islã não por causa de afirmações verdadeiras e específicas sobre Deus, mas porque "aquelas orações árabes me deram o sabão certo para me lavar da América, meu pai, meu padrasto, o Jesus branco, e tudo mais dos colegas de classe ignorantes e caipiras do colégio católico." Agora, ele tem uma linguagem mais nova: menos mulçulmana, mais Five Percent. Na época que ele terminou seu primeiro livro sobre os Five Percent, o Harlem estava "mais conectado" com seu mundo "do que o inimaginado quadro da Arábia pré-moderna. Parar em fente do Hotel Theresa," onde Allah, o primeiro Five Percent, foi preso em 1965,"ou visitar o parque Marcus Garvey, onde Allah estabeceu seu primeiro parlamento, me afetariam não menos como uma peregrinação [à Meca]." 

Na introdução de seu livro, Knight oferece um pouco de aconselhamento a outros acadêmicos fazendo trabalho de campo: "Mantenha sua defesa e distância. Vocês gastam muito tempo com cultura e falham ao checar a si mesmos, vocês se apaixonarão e se tornarão o seu objeto."

Mas como irá você saber se chegou perto demais do seu objeto? Para Knight houve claros sinais. Em 2008 ele fez a tradicional peregrinação a Meca. "Aqui estou eu," contou-me ele, "um quase muçulmano ortodoxo em Meca, andando ao redor da Kaaba" - o santuário que muçulmanos de todo o mundo encaram durante suas orações - "e interpretando ele através de matemática, as lições, letras do Wu-Tang. Eu tinha que dar sentido aquilo."

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Vocês Não Estão Sozinhas: Homens Negros Feministas em Ação

 

Tradução do texto You Are Not Alone: Black Male Feminists in Action de Charles H. F. Davis III publicado na Clutch Magazine em 10 de outubro de 2011. Acesse o texto original clicando AQUI

Feminismo masculino, e feminismo negro masculino em particular, são tópicos relativamente novos dentro dos discursos de gênero masculino-feminino. Com a crescente insatisfação e intolerância global por injustiça, especialmente à agora altamente visível opressão de mulheres e garotas, esta conversa é mais pertinente do que nunca.

Clutch previamente publicou um artigo sobre a aversão de um homem ao feminismo  (leia AQUI) e outro sobre a jornada pessoal de um homem em direção ao pensamento feminista (leia AQUI). Sendo assim, alguém poderia perguntar: “há ainda necessidade para outro artigo neste tópico tão cedo?” Sendo que desde a publicação de quaisquer dos artigos citados, nem depois da publicação deste, o comportamento opressivo masculino ou a adoção de auto-imagens negativas por mulheres e garotas se cessará, há certamente lugar para continuar esse diálogo.

Aqui são oferecidas algumas poucas reflexões sobre a minha epifânias em relação a idéias opressivas sobre masculinidade, pensamento negro feminista masculino e o meu próprio trabalho como o de colegas educadores de jovens homens negros. Nesse aspecto, este artigo espera não somente definir mais concretamente essa noção de pensamento [negro] feminista masculino, mas também lançar luz sobre porque ele é importante e o que esta idéia pode e deve se parecer na prática.

Enfatizar questões entre grupos e sub-grupos oprimidos é a tarefa do ativismo. Geralmente mal interpretado, ativismo não é meramente as muitas e várias vozes em primeira pessoa de vítimas assumidas falando sobre a posição daquelas vozes sendo articuladas por todas as pessoas em nome da humanidade. Isto dito, o feminismo para além dos mitos sensacionalistas do final dos anos 1960 e início dos 1970, muitos dos quais ostensivamente brancos, é uma forma de pensamento que apóia as vozes de mulheres mais do que silenciá-las em um mundo de dominação masculina. Por esta razão, e apoiado pelos recentes trabalhos de Deborah MacDowell e Michael Awkward, eu – um homem negro heterossexual – acredito que cabe aos homens negros tomar a responsabilidade de serem defensores e aliados das mulheres negras por uma justa percepção, enquadramento e tratamento das mulheres por nossos colegas homens, predecessores e contemporâneos.

Se incumbir do papel de defensor e aliado é uma ação participativa. Muitas críticas vindas da academia e blogosfera geralmente de maneira acurada sugerem que não há lugar mais para um “ativismo de armário” no século XXI. Eu, ocupando ambos lugares, tenderia a concordar que a maior parte da retórica sem agência – a intencional habilidade para intervenção e ação – está sujeita a debate. Tal como, o que ocorre na frente das mesas de comentadores, sábios, acadêmicos e escritores é tão importante quanto o que ocorre por trás delas. Para mim e vários outros homens, este é precisamente o trabalho no qual estamos engajados.

No final dessa semana estarei na Syracuse University para falar com a fraternidade dos homens de cor sobre humanidade e masculinidade. É minha esperança que através de nosso diálogo coletivo como homens nós possamos começar a desafiar e mudar nosso entendimento sobre não somente sobre o que significa ser um homem, mas também pessoas vivendo vidas válidas de se lembrar da oportunidade de mudar o mundo. Através do entendimento de questões de misoginia dentro da vida da faculdade e fraternidade e seus efeitos não somente sobre mulheres mas homens também, esses estudantes podem começar a agir. Este tipo de trabalho é imensuravelmente importante no que diz respeito a tarefa de auxiliar e assistir a desconstrução de masculinidades destrutivas – idéias e performances de masculinidade – muitas das quais oprimem diretamente mulheres. 

De workshops de larga escola como essa a conversas diárias com homens negros em meu campus, o trabalho de construir uma grande comunidade de homens negros progressistas está sendo feito. Não somente na área do feminismo masculino engajado, mas também nos tópicos de heterosexismo e homofobia; contudo, isto é outra conversa para outro dia. Similarmente a mim, a retórica e ação participativa com jovens homens negros e garotos de Jonathan Berhanu, Frank Harris, Tyrone Howard, David Ikard, Howard JeanDumi Lewis, Keon McGuire e incontáveis outros é um testemunho que meus esforços não são e nem deveram ser uma exceção.

Cada um de nós tem uma única chance de replicar a nós mesmos nas vidas dos outros. Em entender a longa história da dominação masculina, e resistência feminina/feminista a esta dominação, nós devemos compreender que a luta por igualdade e equidade nem começa nem termina conosco. Para estes jovens homens negros e garotos, sendo influenciado pelo contágio de uma idéia – construindo uma realidade melhor para esposas, mães, irmãs e filhas ainda não nascidas –, ótimos avanços podem ser feitos. Deixe este artigo de algum modo e em termos inequívocos re-inspirar esperança e fé para as mulheres negras saberem que elas não estão sozinhas; nós estamos com vocês e em oposição a todas as coisas que estão contra vocês. Nosso comprometimento como inovadores, educadores e motivadores é de criar novas gerações de “novos homens negros” de Mark Anthony Neal, os quais são conscientes do seu papel no avanço das mulheres como meios de avançar a si mesmos. O artista/ator Common nos lembra que, “quando nós diminuímos nossas mulheres nossa condição parece piorar.” Este é o nosso grito de batalha, que vitória possa ser conquistada.

sábado, 8 de outubro de 2011

O Menelick 2 Ato


Há tempos que eu venho reclamando da chatice que a Revista Raça se tornou (leia AQUI) e da falta de veículos de informação, seja na mídia escrita, televisionada ou virtual, voltados para um público preto, jovem, urbano e antenado produzido por gente do mesmo naipe.  Os grandes jornais e revistas ainda continuam com uma mentalidade retrógrada que estabelece uma representação de preto/as como não consumidores, pouco sofisticados e destituídos de demandas diferenciadas em relação a jovens de outros perfis raciais. Pois bem, “até agora você não disse nada de novo, Márcio Macedo”, a sua pessoa deve estar pensando. Infelizmente, é verdade.  Mas surpresas acontecem…

Ano passado, ao visitar o Brasil, peguei uma pequena revista informativa em algum show, loja de disco ou lançamento que fui em São Paulo. Sou daqueles que vai jogando as coisas na mochila e deixa pra ler depois. Apenas folheei a revistinha que mais se parecia a uma versão mais arrojada, bonita e bem produzida dos velhos fanzines. Mas eis que a dita cuja da revistinha se perdeu no meio da bagunça em que vivo em NYC e, a essa hora, deve estar jogada em algum canto de um depósito do Queens onde guardo minhas coisas durante as visitas de férias e/ou trabalho ao Brasilzão.  Mas coincidências também acontecem. No meio deste ano novamente em visita a terrinha peguei vários números da tal da revistinha em algum lugar de SP que não me lembro e depois fui presenteado com mais um exemplar da mesma por minha amiga Valéria Alves que assina um texto no último número de O Menelick 2 Ato: Brasilidades e Afins.
 

O nome é inspirado em um jornal - O Menelick – vinculado ao que se convencionou chamar de “Imprensa Negra” e que circulou em São Paulo nos anos 1910. Seu idealizador à época foi o poeta Deocleciano Nascimento. Atualmente, quem está por detrás da empreita do 2 Ato do Menelick é o jornalista e fotógrafo José Nabor Jr. que de 2007 a 2010 desenvolveu o projeto da agora revista impressa num blog homônimo.

Dos seis números lançados até agora devo ter uns quatro. A proposta do projeto é interessante justamente por não se fechar em nenhuma manifestação cultural ou artística específica, mas sim querer da conta do universo das manifestações culturais afro-brasileiras e da diáspora negra como um todo. Contudo, mesmo que esse seja o objetivo, pela leitura dos textos fica claro (ou escuro!) uma predileção por temas mais relacionados as manifestações negras da cidade e do estado de São Paulo, o que acho um ponto positivo da revista. Outro ponto visível ao folhear os números, obedecendo a sua cronologia, é um arrojamento e melhoria dos textos – assinados em sua maioria por jornalistas, artistas e cientistas sociais em geral – e do projeto gráfico.

  EDIÇÃO #06

Por outro lado, penso que ainda falta uma revista eletrônica negra decente e que seja alimentada diariamente por textos de diferentes escritores discutindo assuntos polêmicos, apresentando novidades, fazendo resenhas de livros, discos, exposições de arte além de explorar temas políticos relacionados a população negra e jovem sem a caretice de textos militantes. Um bom exemplo disso pode ser visto na revista Clucth (visite AQUI o site dos caras e leia AQUI um post meu sobre a revista). O Menelick 2 Ato segue um bom caminho, mas pode se expandir e melhorar ainda mais. Hoje à noite rola o lançamento do seu oitavo número em SP. Se você não tiver nada pra fazer e se interessar pela parada cola lá. Mais informações no flyer abaixo ou no blog O Menelick 2 Ato.

Muita Paz!

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Professor Derrick Bell (1930 - 2011)

 
 
Não vou falar de Steve Jobs (1955-2011), pois é covardia concorrer com os grandes jornais. Sem dúvida que o cara foi a grande figura do mundo dos negócios e tecnologia nos últimos 10 anos e, de alguma forma, mudou a forma como vivemos. Entretanto, ontem também faleceu nos EUA uma grande figura do movimento pelos direitos civis e do mundo acadêmico afro-americano: Derrick Bell (1930-2011). Bell (foto acima), assim como Jobs, foi vítima de câncer e faleceu num hospital da região Upper West Side de Nova York ontem à tarde. Ele foi o primeiro negro a receber um cargo vitalício de professor no curso de direito da Harvard University e, posteriormente, tornou-se o primeiro diretor da escola de direito da mesma instituição acadêmica. Mas Bell ficou também conhecido por seu ativismo, por rejeitar cargos de prestígio em favor de seus posicionamentos políticos e por ser um dos percusores do que viria a ser conhecido como critical race theory: um conjunto de estudos, inicialmente desenvolvidos na área do direito, que evidencia como o racismo é parte integrante da engrenagem de funcionamento de várias instituições.

Uma faceta interessante da perspectiva elaborada por Bell é o uso de "storytelling", ou seja, o uso de parábolas ou histórias para exemplificar ou reforçar pressupostos teóricos.  Mas isso ocorreu lá pelos anos 1970, muito antes que livros como It Was Like a Fever: Storytelling in Protest and Politics (2006), da professora de sociologia na University of California, Irvine, Francesca Polleta, fossem lançados evidenciando os usos políticos desse método que se disseminariam na política e no ativismo.

Nos anos 1990, o público americano não acadêmico teve um contato mais íntimo com o trabalho de Bell. O filme Cosmic Slops, produzido e lançado por um canal de TV em 1994, é uma trilogia de três pequenas histórias. A primeira delas é "The Space Traders", baseada num conto do livro Faces at the Bottom of the Well: The Permanence of Racism (1992) de autoria de Derrick Bell. Nela o autor descreve alienígenas que visitam o planeta e fazem uma oferta aos EUA: ouro suficiente para sanar o dívida nacional, uma porção química mágica que limparia céus e rios poluídos do país e uma ilimitada fonte de energia limpa e segura para substituir as já escassas reservas de energia da América. Em troca disso tudo, as criaturas pedem por apenas uma coisa: tomar posse de toda população negra dos EUA, que seria levada para o espaço. O governo norte-americano resolve convocar um referendo público para decidir sobre a oferta e... Veja o desfecho da história no filme que pode ser assistido por inteiro clicando neste link AQUI.  Lembrando que o título da película é baseado numa canção homônima do músico de funk George Clinton de 1973.

Um obituário mais completo de Bell, publicado pelo New York Times, pode ser lido AQUI.

Derrick Bell, rest in peace!

domingo, 25 de setembro de 2011

If Beale Street Could Talk

If Beale Street Could Talk é o décimo terceiro livro de James Baldwin (1924-1987), lançado em 1974, e meu romance predileto dele.  Ironicamente, o li apenas uma vez há pelo menos oito anos atrás num exemplar da biblioteca da FFLCH/USP. Mas desde que fui para NYC já comprei três exemplares dele, em diferentes ocasiões, que nunca ficaram na minha estante: foram dados, com amor e carinho, a pessoas especiais.



O livro conta a história de uma garota negra de 19 anos apelidada Tish cujo nome verdadeiro é Clemetine. Ela está apaixonada por um escultor de 22 anos, Fonny, cujo nome original é Alonzo. Ambos moram no Harlem e amor vivido pelo casal os protege de suas respectivas famílias problemáticas e o complexo mundo em convulsão que o cerca. No entanto, logo após o noivado do casal Fonny é falsamente acusado de estuprar uma mulher porto-riquenha, Victoria Rogers. Ele é acusado por um policial racista (Officer Bell) and e é imediatamente preso o que, de certa forma, coloca seu noivado em compasso de espera. Rogers, a vítima de estupro, deixa os Estados Unidos voltando para Porto Rico e a mãe de Tish, Sharon, viaja de Nova York a San Juan buscando reunir provas que possam libertar Fonny. A narrativa de Baldwin alterna os pontos de vistas tanto de Tish como de Fonny. Desde o primeiro capítulo a história é uma combinação entre partes extremamente doces e delicadas com tristeza, amargura e melancolia. Passagens com vívidas descrições de relações sexuais se transformam numa sutileza sem tamanho devido ao talento e capacidade de Baldwin em criar imagens e trazer alegria e humor onde alguém só veria dor e obscenidade. Assim ocorre quando ele narra a  primeira vez em que Tish e Fonny transam e ela perde a sua virgindade ou o sexo dominical (e hilário!) que os pais de Fonny sempre fazem após o retorno de sua mãe da igreja em graça com o Espírito Santo. A narrativa de Baldwin concentrasse no esforço da família Rivers (Tish) em se manter unida até o final do drama vivido por Fonny. Embora a mãe e as irmãs de Fonny não se preocupem em salvá-lo, os Rivers o tomam como seu próprio filho. Eles passam a fazer hora extra no trabalho para juntar dinheiro que é usado para arcar com as despesas com advogado e também pagar a fiança de Fonny, caso ela venha a ser estipulada. Ao final, Fonny consegue sair da prisão sob fiança para ver seu filho nascer, mas não antes de seu pai cometer suicídio.

 
Infelizmente, não há traduções para o português de If Beale... como acontece com The Price of the Ticket (1948), Giovanni's Room (1952), Another Country (1962), The Next Time Fire (1963) e outros que não me lembro agora. Mas se você encarar o idiomazinho imperialista vai só lucrar na leitura desse belo e curto romance. Meu amigo Alex Ratts, professor de antropologia na Federal de Góias, disse que está tirando do forno um texto no qual analisa os livros de Baldwin traduzidos para o português. Estou curioso e ansioso para ler. Enquanto isso, vale a pena dar uma xeretada nesse artigo de Caryl Phillips escrito para o jornal inglês The Guardian em julho de 2007 (leia AQUI). Para uma resenha (em inglês) mais completa do romance If Beale... clique AQUI

Finally, dear Jimmy, thanks a lot for your inspiring books! 

Muita Paz, Bom Domingo!

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Minha vidinha interiorana 1: uma visita a livraria e encontro com John Updike

Limeira Limeira (foto abaixo da gruta da praça central)... Dois dias atrás ia passando em frente a uma das poucas livrarias que há na cidade (acho que são duas!) e resolvi entrar e dar uma xeretada nos livros. Leitore/as assíduo/as de livros estão sempre em busca de uma pechincha e pensei que essa seria a minha chance. Livrarias aqui são um misto de banca de revistas, papelaria e, finalmente, livraria. A moça, negra e com sotaque que remete ao nordeste, me atendeu com um sorrisso e o clássico "posso ajudar."  Abri outro sorrisso e disse que estava apenas dando um olhada. Não havia quase ninguém no local no final da tarde, algo beirando às 17 horas.

Na verdade, minha curiosidade era descobrir que tipo de livros são expostos nas prateleiras de uma livraria de minha querida cidade natal. Pois bem, descobri. Basicamente as obras de indivíduos cujo os nomes tem algum tipo de repercussão na TV ou revistas de grande circulação como a jornalista Miriam Leitão, o escritor/jornalista Fernando Morais e outras figuras que não preciso citar aqui, são aqueles que estão expostos na, digamos, prateleira principal. Na segunda prateleira há uma série de livros embrulhados em sacos plásticos transparentes - para evitar a poeira - e que já evidenciam o peso da idade devido as capas e páginas amareladas por conta da ação do tempo. A solícita atendente caminha até a minha pessoa e, apontando a prateleira citada, explica que os livros dali estão em promoção: metade do preço original. Animo-me e vou checar os valores que, mesmo com a promoção, não soam nada apetitosos para um estudante de doutorado quebrado como eu. Os títulos são os mais variados e prevalecem os romances. Muita coisa velha das editoras Companhia das Letras e Record, mas títulos que não me agradam muito (leia-se "não ando a fim de ler") no momento como Milan Kundera, Gore Vidal, John Updike, Rubem Fonseca e por aí vai.

Em outra prateleira, já próxima das revistas, é possível ver a coleção Folha Explica na qual especialistas de várias áreas são convidados a escrever e explicar temas complexos contemporâneos de forma sintética. Gosto dessa coleção e noto como a mesma foi inspirada pela famosa coleção Primeiros Passos, da saudosa editora Brasiliense. A propósito, essa série foi idéia de Luiz Schwarcz na época que trabalhou na Brasiliense e alguns anos antes de fundar sua própria editora, a Companhia das Letras, com sua esposa Lilia Moritz Schwarcz. Vejo vários títulos que fico com vontade de ler, mas o preço não é nada convidativo. E eis que mais uma vez a atendente amiga me auxilia...



Dessa vez sem se aproximar muito de mim ela aponta uma prateleira localizada no alto de sua cabeça e diz que os livros ali, também embrulhados em sacos plásticos transparentes, estão numa promoção especial: R$ 9.90. Ok, acho que finalmente achei algo que se encaixe em meu bolso humilde, mas seletivo. Caminho até a prateleira e começo a verificar os títulos. Logo de cara encontro um clássico da antropologia perdido: Sexo e Temperamento, de Margared Mead (que algum estudante de ciência sociais deve ter encomendado e esquecido de ir buscar). Fuço mais um pouquinho e encontro um Charles Baudelaire, A Arte da Crítica. E, por fim, para ganhar o dia, um livro desconhecido do sul-africano J.M. Coetzee. Olha Limeira aí fazendo a minha alegria. Mas o que me chama a atenção tanto nessa prateleira de livros a R$ 9.90 como na outra que eles custam do seu preço original é a quantitade de títulos do escritor norte-americano John Updike (1932-2009). Updike ganhou notoriedade por ser um fiel observador da classe média norte-americana entre as décadas de 1960 e 2000, um tema que acho extremamente chato. Ele fez fama com os "romances coelhos": uma série de livros cuja as publicações vão de 1960 à 2001 e nos quais Updike explora a vida do personagem Harry "Rabbit" Angstrom do seu nascimento a sua morte. Na minha adolescência li dele Brazil (1994), um livro que foi escrito por conta de uma visita do autor a nossa querida pátria varonil. Nessa obra o escritor norte-americano se utiliza do trama da tragédia grega Tristão e Isolda para contar a história de amor entre um rapaz negro/mestiço oriundo das classes populares com a garota branca e loira pertencente a uma família das elites dominantes. E a história se passa num período bastante especial: momentos antes do golpe militar de 1964. Eu, sinceramente, hoje acho o livro bastante clichê e com um olhar distanciado do Brasil, um Brasil com "z" mesmo, para um autor rotulado como realista.  Entretanto, confesso que quando li o livro pela primeira vez gostei: luxos e ingenuidades da mocidade. Mas ainda me pergunto: porque tantos Updikes para Limeira, hein? A classe média daqui gosta de música sertaneja, rodeio e é católica.

Pois bem, assim que tiver um din din voltarei a livraria e pegarei os meus três achados - Mead, Baudelaire e Coetzee - já que tenho certeza que ninguém irá comprá-los. Há muitos Updikes na frente deles.

Muita Paz!

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Realmente Precisamos de Misses Universo?

Alguém por aí deve ter se perguntado o por quê de eu não ter me pronunciado sobre a conquista do título de Miss Universo semana passada por uma negra angolana, Leila Lopes. Well well, é meio difícil explicar as razões do meu silêncio, mas digamos que eu precisava de um pouco de distanciamento temporal do evento para decidir se escrevia ou não o texto que sai agora das teclas do meu laptop. Para início de conversa quero deixar claro que não tinha a mínima idéia de que o concurso de miss universo estava ocorrendo em São Paulo. Só fiquei a par disso através da manifestação das pessoas via Facebook e Twitter durante a realização do evento. Logo após o resultado final do concurso meus/minhas amigo/as começaram a postar mensagens nas redes sociais sobre o fato de uma negra, pela primeira vez, ter vencido a competição. Eram pequenos textos emocionados de gente que até mesmo chorou ao ver a coroação da beleza de uma negra.
 
Pois bem, não quero ser desmancha prazeres, mas minha mais sincera pergunta é: realmente precisamos de misses universo? Em pleno século XXI ainda não conseguimos nos libertar de uma forma de competição e entretenimento que celebra a exploração do corpo feminino e, ao mesmo tempo, impõe padrões de beleza ao restante das pobres mortais mulheres. Alguns irão dizer: "Mas Senhor Márcio Macedo, com a coroação de uma mulher negra esse padrão de beleza foi ampliado." Sim, ampliado em termos raciais. Mas o que percebo mesmo é a necessidade, por parte de nós negros, da legitimação/aprovação da beleza negra por meio de instâncias que remetam a sociedade como um todo. Porém, mesmo Leila Lopes sendo negra, ela é magra, alta, jovem, educada e possue rosto com formatos delicados que, diriam os mais cínicos e irônicos, pouco lembra os traços de seu grupo racial. E o que diremos as mulheres, negras/brancas/asiáticas, que não possuem necessariamente as mesmas formas de Lopes? Mais: indo um pouco além é possível notar como os elementos estéticos valorizados naquilo que alguns autores chamam de branquidade são preponderantes no julgamento da beleza de mulheres negras. E tudo que fugir a isso será entendido como uma "beleza exótica." Well well...
 
Outro ponto que me incomodou nas reações diante da vitória de Lopes foi a impressão de que somente após o resultado do Miss Universo as mulheres negras se tornaram dignas de serem vistas como belas. Ora ora... Concursos de beleza entre a população negra brasileira não são eventos novos. Há quase um século, numa tentativa de emulação da sociedade dominate, a comunidade negra vem realizando seus próprios concursos de beleza. No início do século em São Paulo eles levavam nomes como Bonequinha de Café, nos 1940/1950 os ativistas negros Abdias do Nascimento e Guerreiro Ramos realizavam dois concursos vinculados as atividades do Teatro Experimental do Negro (TEN). Eram eles o Rainha das Mulatas e o Boneca de Pixe. Nos anos 1960/1970 o Renascença Clube localizado no Rio de Janeiro, fundado e frequentado por famílias negras afluentes, ficou famoso por organizar concursos de beleza de mulheres negras e mestiças que acabaram por lapidar a alcunha de "Academia de Mulatas" ao clube. O Renascença foi responsável por revelar Vera Lúcia Couto (foto abaixo) que, após ser eleita Miss Renascença, conquistou o título de Miss Guanabara e segundo lugar no Miss Brasil de 1964. Entretanto, o Miss Brasil só seria de fato conquistado por uma negra vinte anos mais tarde com Deise Nunes (foto acima). Desde os anos 1980 em Salvador o bloco afro Ilê Ayê realiza a Noite da Beleza Negra: um concurso de beleza entre mulheres negras. Mesmo durante minha adolescência nos anos 1990 aqui no interior de São Paulo era comum a comunidade esperar com ansiedade a realização de concursos de beleza nos clubes recreativos que são remanescente da Frente Negra Brasileira (FNB). Em Limeira, por exemplo, ocorria no saudoso Grêmio Limeirense os concursos Miss Pérola Negra e Negro Lindo, esse último uma versão masculina da competição.
 
Os concursos de beleza femininos tem em comum um elemento de gênero: todos eles visam celebrar um modelo de beleza feminino e um padrão de femininilidade. A partir disso, o corpo feminino acaba sendo utilizado como locus de evidenciamento e disputa de projetos políticos alheios as mesmas e que vão muito além da exaltação da beleza. Os corpos das misses legitimam a violência simbólica de estabelecer modelos/formas que devem ser seguidos pelo restante das mulheres, ou seja, uma normatividade (norma/padrão) pois correspondem ao belo e desejável. No caso de concursos de beleza da comunidade negra especificamente, o corpo da mulher negra/mestiça é utilizado como representante do que há de "melhor" da "raça", ou seja, frente aos estereótipos e imaginário negativo que se associa a população negra como um todo é necessário lançar mão de exemplos (de carne e osso) que combatam essas representações. Ironicamente, essas mesmas figuras emblemáticas não deixam de reproduzir certos padrões - que vão além do aspecto racial - que são acriticamente aceitos e, consequentemente, legitimados. Mulheres gordas, baixas, de cabelos crespos, curtos ou raspados (alguém aí já viu alguma miss que não tenha cabelos longos e lisos?) entre outras caracterísitcas que não irei enumerar aqui, são vistas como indesejáveis, pouco belas e fora do padrão. Daí eu pergunto novamente: realmente precisamos de misses universo? Pois bem, caso ainda necessitarmos já temos uma representante negra: Leila Lopes.

Muita Paz!

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Namorado: ter ou não, é uma questão

A coisa que mais gosto de fazer quando acordo é tomar um banho e, logo em seguida, passar um bom café preto que tomo numa enorme caneca preta reluzente enquanto jogo conversa fora com minha mãe (ela toma o mesmo café numa xícara branca), leio minhas mensagens no laptop e xereto as notícias do dia. Logo depois me mando para alguma parte da casa com uns cinco livros dos quais leio umas cinco ou dez páginas de cada, dependendo do tamanho do conto, do capítulo ou ritmo da leitura. Hoje (escrevo ainda na segunda!) acordei cedo (por volta das 10 horas) para quem foi dormir às 5 da manhã. Meu livro predileto de literatura nos últimos dias tem sido Beethoven Era 1/16 Negro e Outros Contos (Companhia das Letras, 2009) da escritora sulafricana Nadine Gordimer, indicação e empréstimo de meu brother Vandão. Pois eis que hoje, ao que começar a leitura do livro, sou estapeado pela frase de abertura de um conto: "Caixas de papéis velhos são como túmulos, nós nunca deveríamos abri-las." Ri alto e corri mostrar a frase para minha mãe que abriu um sorrisso. O motivo: meu quarto extremamente zoneado cheio de caixas abertas com papéis velhos. Estava há mais de uma semana prometendo a minha mãe que iria arrumar o quarto e, finalmente, comecei a arrumação na noite de domingo. Há dias que muitas vezes me demorava quinze minutos antes de dormir devido ao trabalho de tirar de cima da cama um porção de livros, CDs velhos (quem ainda compra CD?), disquetes (quem ainda usa disquetes?), CDs e DVDs regraváveis sem rótulo (que não tenho a mínima idéia do que possuem, talvez um filminho de sacanagem!), trabalhos de faculdade antigos (achei minha primeira resenha musical de 1997), Hip Olívia me olhando com cara de poucos amigos (ela quer voltar para NYC!), revistas velhas e remédios para renite além de ter que mandar embora um dos gatos de minha mãe que habitualmente dorme comfortavelmente em cima de uma pilha de textos fotocopiados e roupas (sujas e limpas).
 
Mas fuçar em "túmulos" também nos recompensa com coisas que vão muito além de "ossos" (lembrei do título do livro de Pedro Nava, Baú de Ossos [1972] que cai aqui como uma luva por se tratar de literatura memorialística). Tenho uma série de cadernos, algo próximo de diários, nos quais rabiscava coisas num passado longínguo em que a Internet não interferia tanto na minha vida. Hoje não escrevo mais a mão, somente anotações rápidas em cadernetas pretas charmosas compradas em papelarias vagabundas novaiorquinas. A tecnologia me deixou orfão nesse aspecto ao perder meu iPhone. Mas eis que no meio de meus rabiscos velhos achei algo fenomenal: um texto bonito pacas de Drummond copiado a mão de sabe-se lá de onde. By the way, o texto cairia muito bem pra um dia dos namorados, mas como essa data está distante para ser novamente comemorada subo ele hoje mesmo. Já vou avisando que não estou apaixonado nem necessariamente procurando namorada (e isso se procura? *rs*), mas achei o texto do grande poeta mineiro válido de uma postagenzinha...

Muita Paz!


Namorado: ter ou não, é uma questão

 

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação de pele, de saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa de filosofia. 
Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil. Mas namorado mesmo é muito difícil. 
Namorado não precisa ser o mais bonito, mas aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa ser parruda, decidida ou bandoleira: basta um olhar de compreensão ou mesmo aflição. 
Quem não tem namorado não é quem não tem um amor: é quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes, mesmo assim pode não ter namorado.
Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema, sessão das duas, medo de pai, sanduíche da padaria ou drible do trabalho. Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa e quem se ama sem alegria. Não tem namorado que faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com felicidade ainda que rápida, escondida, fugida ou impossível de durar. Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho escondido na hora que passa o filme; de flor catada no muro e entregue de repente; de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes e Chico Buarque lida bem devagar; de gargalhada quando fala junto ou descobre a meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.

Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer cesta abraçado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhado de alegria pela lucidez do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, shows do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos ou musical da Metro.



Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, que não chateia com o fato de ser bem paquerado. Não tem namorado quem ama sem gostar; quem gosta sem curtir; quem curti sem profundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada ou no meio dia de sol em plena praia cheia de rivais.  Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar que o outro vá junto com ele. Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho em paz. Não tem namorado que não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de afetivo.
Se você não tem namorado porque descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e de medo, ponha a saia mais alegre, aquela de chita, e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma com leve fricção de esperança. De alma escovado e coração estourado saia do quintal de si mesmo e descrubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para passar debaixo de sua janela.
Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas. Cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteio. Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido.

Carlos Drummond de Andrade

PS: obrigadinho a minha amiga Élida Aquino pelas fotos sempre inspiradoras...