Domingo à tarde, 18/10, fui dar um xeretada num exposição num museu próximo ao SoHo, já que queria dar uma relaxada da rotina chata de leituras, leituras e mais leituras. Era o último dia da exibição Emory Douglas: Black Panther no New Museum (Bowery Street, 235). A foto ao lado foi tirada no meu iPhone e é do hall de entrada da mostra onde os caras reproduziram num mural uma obra do artista.
Para quem não sabe, o Black Panther Party For Self Defense foi uma organização negra criada em Oakland, Califórnia, que atuou nos EUA de maneira efetiva entre 1966-1980. Suas figuras de frente foram Bobby Seale e Huey P. Newton. A analogia à Pantera foi incorporada devido a mesma ser, de acordo com os fundadores, um animal que só ataca como forma de auto-defesa. Os Panthers surgiram no contexto dos assasinatos das duas grandes lideranças negras contemporâneas - Malcolm X (1925-1965) e Martin Luther King Jr. (1929-1968) - e incorporavam paradigmas ideológicos que passavam pelo marxismo, maoismo, nacionalismo negro e pan-africanismo. Na exposição havia uma cópia da lista de leituras obrigatórias de um militante panther, que, segundo depoimentos de participantes, tinha um programa intensivo de leitura entre 6 a 8 semanas antes de se juntar a organização. Na lista constavam autores como Frantz Fanon, Marcus Garvey, W.E.B Du Bois, Kwane Kruman, Malcolm X, John Hope Franklyn, C.L.R James, Karl Marx entre outros.
Emory Douglas (nego véio da foto aí de cima) foi ministro da cultura do grupo (ele se apresentavam como um Estado e cada militante tinha uma posição dentro do grupo) e se juntou aos Black Panthers vindo do Movimento de Artes Negras que abateu os EUA nos anos sessenta. Foi o momento em que temas como a descolonização do continente africano e a renovação da estética negra teve um impacto direto nas produção de artistas afro-americanos. Na poesia e literatura apareceram nomes como Maya Angelou, Nikki Giovanni e James Baldwin ao ponto que jazz vivia experimentações profundas através de músicos da avant-garde como Mile Davis, John Coltrane e Charles Mingus, a soul music que incorporava elementos mais críticos nas letras e cuja sonoridade ia se radicalizando por meio de James Brown. Gil Scott-Heron cantava The Revolution Will Not Be Televised e dava, junto com os The Last Poets, os primeiros passos no canto falado que anos mais tarde, juntando-se a ritmos jamaicanos com o toast, formaria o que se conhece hoje por rap. No Harlem (com o bicho pegando devido a vários riots), foi o momento que houve o estabelecimento do The Studio Museum in Harlem local de encontro e produção de artistas negros da Big Apple e de regiões próximas.
A produção de Douglas tem uma pegada, como pode ser vista em algumas imagens aqui do post, de art pop, algo que iria se estabelecer com força na cena artística e tomar as galerias do gentrificado SoHo nos anos 1970 e 1980 através de figuras como Andy Warhol (1928-1987) e seu pupilo Jean-Michel Basquiat (1960-1988). Douglas, por sua vez, tinha objetivos políticos muito mais claros. Pensava a revolução não só como state of mind, mas como realidade. Entretanto, os desenhos do artista não deixam de ter muito humor, algo que me lembra um pouco Ernesto "Che" Guevara (1928-1967): "Hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás!". No caso do truta Douglas, seria "não perder o humor"... Veja o quadro dos Pigs (maneira como os Panthers se referiam aos brancos imperialistas do poder nos EUA e na Europa) abaixo...
Em um outro quadro que vi na exposicão há um pig falando ao telefone e segurando um livro intitulado "Manual Para Sequestro do F.B.I.". Ironicamente ele está numa ligação com os Panthers dizendo: "Alô Black Panthers, eu estou muito grato em lhe informar que teremos um grande prazer em marcar uma reunião com o presidente da sua organização". Hilário! Infelizmente, a história da conspiração armada pelo governo americano para o desmantelamento dos Panthers não é nada engraçada. Por volta de 25 lideranças foram mortas em condições suspeitas até o final dos anos 1970. Muitos outros foram presos e alguns continuam na prisão ou no exílio até hoje.
Felizmente, Douglas ainda está aí para contar histórias e produzir mais coisas legais em nome da libertação negra. A imagem abaixo é a capa de um álbum do grupo de rap Digable Planets, Blowout Comb (1994), e foi inspirada no layout do jornal dos Panthers elaborado por Douglas e onde sua produção circulou majoritariamente nos anos 1960/1970.
Pois é, vida longa a Douglas e Muita Paz Rapaziada!
terça-feira, 20 de outubro de 2009
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4 comentários:
Salve guerreiro...
"Por volta de 25 lideranças foram mortas em condições suspeitas até o final dos anos 1970. Muitos outros foram presos e alguns continuam na prisão ou no exílio até hoje."
C sabe dizer onde a gente acha mais informações sobre isso aqui? Tem um texto muito bom do Ollie A. Johnson q fala do "The King Alfred Plan" do FBI contra os panteras...
abração!
"condições suspeitas" é o cacete! Muitos foram executados, simplesmente. Por outro lado, não vejo nenhum humor na história dos caras,que eram violentos prá cacete, e que se matavam uns aos outros com alguma frequência, aliás. E o tal de humor do poster, caramba, Kibe, tu num conhece o "humor" comunista, não, né? Coisa velha, meu.
Pô Ari,
Não fui comunista, cara! Talvez você e Batistão saquem melhor essas paradas, mas eu só comecei a me entender como gente na época da queda do muro e da Guerra do Golfo.
Abraço,
Márcio/Kibe.
Nem eu, mas, claro, vivi o negócio, e dei uma estudada. O humor comunista , sempre repetitivo, se comprazia em transformar os inimigos (da hora) em inumanos. Assim, seria uma tarefa de limpeza aniquilá-los (os nazistas foram na mesma batida)...
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