quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Marshall Sahlins e a Imaginação Antropológica

Meus/minhas amig@s antropólog@s no Brasil morram de inveja. Na última segunda-feira, 21/9, tive o prazer de assistir uma lecture com nada mais nada menos do que Marshall Sahlins (foto ao lado e tirada na ocasião), uma das grandes figuras da antropologia comtemporânea.

O evento ocorreu no Heyman Center for Humanities da Columbia University e faz parte de uma série de seminários que rolará até o final do ano e contará com intelectuais de peso como Noam Chomsky, Robert Darnton, Judith Butler, Charles Taylor, Amartya Sen dentre outros.

Sahlins é velho conhecido de qualquer novo ou velho antropólogo que se preze. Famoso por sua releitura do estruturalismo de Claude Lévis-Strauss acrescentando uma perspectiva histórica a teoria do etnólogo francês, o intelectual ganhou um lugar permanente no campo antropológico ao lado de nomes como Franz Boas (1858-1942), de origem alemã, mas radicado nos EUA onde lecionou na Columbia University, e Clifford Geertz (1926-2006).

Sahlins realizou sua conferência expondo os argumentos centrais de seu último livro cujo título, The Western Illusion of Human Nature ,(2008), deu nome a sua fala. Em termos gerais, o antropólogo defende a idéia de que as instituições políticas ocidentais tem se baseado numa dicotomia entre natureza e cultura para legitimar a existência do Estado. De acordo com Sahlins , as formas de governo (monarquia, democracia, anarquia e república) fornecem uma forma do Estado lidar com essa dicotomia. O intelectual começou sua fala citando a invasão do Iraque pelos Estados Unidos ocorrido em 2003 e declarações do secretário de defesa dos EUA à época, Donald Rumsfeld, sobre a necessidade de se levar a democracia ao povo iraquiano. Entretanto, a ação americana trouxe mais violência ao país e muitas vezes o aproximou ao que poderia ser chamado de um suposto "estado de natureza" que a democracia deveria suplantar. A partir desse episódio, Sahlins passou em revista vários pensadores políticos para explicar como cada um lidou com a dicotomia natureza/cultura.



Exibindo bom humor, o antropólogo fez piadas com as quais o público, estudantes e professores, se deliciava. Thomas Hobbes (1588-1679) foi um dos que entrou na roda. Antropologicamente malicioso, Sahlins afirmou que "it takes too much culture to make a state of nature" (é preciso muita cultura para produzir um estado de natureza), ridicularizando de forma elegante o autor de Leviatã (1651) que cunhou a célebre frase de que o homem seria o lobo do homem. Com muito entusiasmo o antropólogo passou em revista Montesquie, Rousseau, Os Federalistas e ainda citou Platão. Mais piadas vieram quando Sahlins disse que a sociedade moderna capitalista tem produzido versões industrializadas de retorno a natureza: água mineral em garrafa ou o apelo recente ao consumo de organic food.

http://www.zahar.com.br/doc/c0204.jpg

O antropólogo brincou com as teses de Freud ao citar a maneira como determinados grupos indígenas lidam com os sonhos. De acordo com ele, caçar nessas sociedades significa "make love with the nature". Sendo assim, quando um caçador sonha com sexo o sonho é interpretado como um sinal de que sua "caça" será frutífera. Ainda ouve espaço para tirar sarro da obsessão por individualismo e livre-arbítrio norte-americano além do mal-humor dos novaiorquinos com uma última piada. Um senhor passa pelo caixa de um supermercado e a atendente termina a transação dizendo o peculiar "Have a nice day sir!" ao que ao morador da Big Apple responde de forma irada, "Don't tell me what to do...".

Por fim, a posição de Sahlins quanto a dicotomia natureza/cultura, que seria constitutiva da sociedade moderna e ocidental, é de que ela não existe, é uma ilusão. Cultura e natureza são constitutivas da experiência humana de modo que a primeira media a segunda no processo de criação do que pode ser chamado de "natureza humana".

Leia e/ou baixe AQUI um texto de Sahlins em português publicado em 1997 na revista de antropologia Mana.

11 comentários:

Punk Canibal disse...

A discussão da política a partir dos paradigmas da antropologia (sobretudo lévi-traussiana a partir de Clastres, mas também de Mauss, eu diria...) é o que está pegando agora pra intelectuália aqui da "Terra Sem Males" Tupinambá-Tupiniquim (isto é, RJ-SP...).
Have a nice day, Kibe Kru!

Márcio Macedo disse...

Don't tell me what to have, Guilherme! ...hahahahaha...

Abraço vagabundo!

Márcio/Kibe.

Jaqueline disse...

O que será que vem depois disso?
:)
A antropologia hoje é fundamental para ser trabalhada transversalmente em todas as áreas de conhecimento, principalmente porque vem descontruindo os essencialismos, naturalizações, generalizações, oposições binárias e dicotomias estáveis.

:P "Have a nice day, Kibe Kru!"

Jaqueline disse...

Ah, ela vem desconstruindo coisas que ela também ajudou a construir...

Verare disse...

Hi Kibe,

Delicie-se! Morri de inveja, mas com um gostinho do tipo "bom pra pensar", afinal tenho uma tese para escrever.
Abração!

Márcio Macedo disse...

Hi Jac e Vera,

Obrigado pela leitura. Eu devo ser um antropólogo enrustido... hahahahaha...

Beijos,

Márcio/Kibe.

Ari disse...

o veito disse ilusão mesmo? Em quals entido? Freudiano? Lógico? Gostei da piada mau humorada. Mas que deve dar vontade de soltar a resposta de vez em quando, dá?
E, claro, queria saber se essa tal dicotomia tem idade...Pois as formas de governo apontadas são BEM velhinhas, e não há nada peculiarmente ocidental nelas...

Márcio Macedo disse...

Foi bem legal Yuri, bem legal!

Abraço,

Márcio/Kibe.

Renata disse...

Putz, não sou antropóloga mas também fiquei morrendo de inveja...
Bjocas

Ana Fiori disse...

Bacana, Kibe...

Sahlins ruleia!

Márcio Macedo disse...

Queridas Renata e Ana,

Valeu mesmo pela leitura!

Beijos do Kibe.