terça-feira, 12 de agosto de 2008

USA: first impressions...

Mensagem coletiva em forma de etnografia! Cheguei no aeroporto JFK numa tarde quente de sexta-feira. O sol aqui nessa epoca nao se põe antes das 20 horas devido ao horário de verão. O vôo havia sido tranqüilo apesar do meu cagaço em ficar nove horas acima das nuvens e sobrevoando o oceano Atlântico. No geral, a tensão maior fica sempre para a decolagem e o pouso. Contudo (talvez não devesse usar esse advérbio *rs*), tudo correu bem mesmo voando de TAM. O JFK fica longe do centro de NYC, então esqueça toda aquela baboseira de ver a Estátua da Liberdade do alto como é possível fazer com o Cristo no Rio. O máximo que você vê é um monte de casas e carros passando embaixo de você. No avião tive a companhia de uma senhora (Zilda Aparecida Lanzoni, lembro do nome porque preenchi os papéis de entrada nos EUA dela) na casa dos sessenta anos moradora de Nova Odessa (interior de SP) que estava indo visitar o filho bem sucedido (formado em engenharia na Unicamp e com mestrado nos EUA) em New Hampton. A minha frente sentou um casal que descobri serem conterrâneos meus, ou seja, moradores de Limeira (SP). Recém casados, os dois estavam indo passar a lua de mel nos EUA. Acho que Paris e Poços de Caldas não encantam mais os pombinhos, assim como a frase “quando foi a primeira que viu Paris” já não se aplica a maneira de perguntar as mulheres quando se perdeu a virgindade.

Os caras da Immigration Service são mal encarados e se encaixam perfeitamente no que se vê nos filmes que assistimos na TV, especialmente quando param de trabalhar e começam a tomar café (o horrível café americano!) no copos branquinhos estilo Starbucks. Os negros parecem ser mais simpáticos, mas não fui entrevistado por um para ter certeza. O cara que revisou meus documentos parecia ser descendente de italianos pelo sobrenome (Di Nicola) e foi seco e direto: “what are you in US for?”, “how long will you stay here?”. Perguntas diretas pedem respostas diretas, então, fui o mais sintético possível e nada de gracinhas ou perguntas pessoais como aconteceu no consulado americano em SP (alguns de vocês sabem do que estou falando). Felizmente, nada aconteceu comigo e não fui deportado de volta para o Brasil e nem mandado para Guantanamo para conhecer Cuba em território americano.

Welcome to USA! Big cars, big business, big money and no big buts, specially if you’re talking about white women! Minhas primeiras semanas aqui serão num bairro de subúrbio de Stamford (CT), cidade localizada a 30 minutos de carro de NYC. O lugar parece o cenário de Desperate Housewives: casinhas bonitas com carrões estacionados na frente e gramados com cercas brancas que lembram algo quase bucólico. Ninguém vai a lugar algum a pé, afinal, o carro é a maior invenção dos últimos 110 anos. Andar na rua é uma sensação estranha, já que a mesma fica vazia mesmo se tratando de uma tarde de domingo. Hoje fui até o supermercado comprar manteiga e tentar um café decente no Starbucks, na volta conversei com uma senhora cujo cachorro latia pra mim como louco. Disse a ela que o cachorro estava bravo e ela respondeu que ele era chato mesmo. Detalhe: os moradores de Connecticut são bastante amáveis e sempre se mostram abertos a perguntas e comentários respondendo até com piadas.

Ontem fui a NYC conhecer o apartamento onde vou morar no Harlem. Bem, o local é bem aquilo que vemos nos filmes: negraiada pra todo lado! Mas não se engane: o bairro vive um processo visível de gentrification (resumidamente como se chama o processo de valorizacao de areas antes vistas como deterioradas conjuntamente a expulsao dos moradores pobres e vinda dos mais ricos com uma serie de servicos) e já é possível ver caras pálidas (meus amigos brancos não fiquem bravos com a expressão) pelo local que nada mais são do que os novos moradores. Também já há prédios que foram comprados por personalidades como Bill Clinton, Jay Z e Magic Jhonson e estão sendo reformados criando um contraste entre o velho (pobre) e o novo (rico) na região. Também, pudera: o Harlem está localizado em Manhattan, a região mais valorizado de NYC, mas o valor dos aluguéis e das propriedades é muito mais baixo do que outras partes da ilha. Mas o Harlem é o velho Harlem ainda e a riqueza e pobreza vivem conjuntamente. É possível ver mendingos em cadeiras de rodas ou empurrando carrinhos de supermercado perto de alguns brownstones (tipo de prédio residencial de dois andares todo marrom e com aquelas escadinhas bonitas na entrada) em ruas tranqüilas onde vivem arquitetos, médicos e executivos negros que compraram suas novas casas por algo em torno de um milhão de dólares. O clima do lugar é agradável e as pessoas são bem amáveis! Há muitos idosos e alguns (na quase totalidade homens) caminham pelas ruas com um ar debillitado efeito de algum tipo de bebida (lembrei de Flávio quando me disse que nos EUA você não vê as pessoas bebendo, mas as vê bêbadas! *rs*). Nas calçadas pode se comprar de tudo relacionada a negritude do primeiro mundo: roupas da moda hip hop, CDs, óleos de todos os tipos, para os mais diversos fins e originários de várias partes da África e do Caribe, bolsas e roupas com temas africanos, salões de cabeleireiros para as mulheres e barbershops para os homens (afinal, o que seria da negrada sem um salãozinho para dar um tapa no belo), restaurantes servindo comida jamaicana ou soul food, igrejas e as casas funerárias que são um tipo triste de tradição do bairro (Dionne me explicou que na época de muita violência no bairro as casas funerárias eram um modo das famílias ganharem uma grana tendo um negócio próprio e legal). É incrível como as pessoas ocupam as ruas sendo que as concentrações maiores se dão em lugares como as liquor stores (lojas de bebidas) onde uma porção de vagabundos ficam hanging out na frente. É tradição também ter um tipo de sofá ou cadeira na calçada no quais jovens e velhos (todos homens) ficam observando o movimento da rua de maneira confortável. Vou morar na 153 West 117th Street - NYC (va em: http://maps.google.com/ e jogue o endereco que voce ve a parada com direito a foto), há dez minutos a pé da estação de trem e mais dez minutos a pé distante do Central Park. Okay, mas se vierem na minha casa e chegarem tarde (depois de anoitecer), não vacilem e peguem um taxi cab que no Harlem não são amarelinhos como no resto da cidade, mas pretos. Isso também é uma tradição no bairro, já que a maioria dos motoristas de táxi se recusavam a fazer corridas até o bairro com medo de serem assaltados ou mesmo mortos, algo que fez com que os moradores locais criassem seu próprio serviço de táxis. Enfim, é impossível ir ao Harlem e não ficar pensando em lugares como Pelourinho em Salvador ou o centro velho de SP, locais onde a memória e experiência negra se faz presente de modo diferente e similar.

Caminhei da rua de minha nova casa até o Central Park e dali peguei a Fifth Avenue que e uma espécie de Jardins da cidade em direção a Times Square. Nem preciso dizer que a paisagem muda de maneira significativa. Os rostos negros vão desaparecendo e as ruas tomam um aspecto de melhor cuidadas com calçadas cheias de jardins bem tratados. Os porteiros vestem uniformes elegantes e os prédios que são residenciais (mas comerciais também) exibem placas que identificam os médicos (com MDs, medical doctors) e advogados que ali atendem. Passei em frente ao Gugenheim Museum e o Metropolitam Museum até chegar na 25 de Março do primeiro mundo (Times Square) com suas lojas Gucci, Louis Vuitton, Prada entre outras. Os turistas (tanto americanos como estrangeiros) tomam conta do lugar e é difícil caminhar pelas calçadas. Um nova-iorquino evita essa região da cidade e agora entendo o porquê. Depois de comer frango no BBQs e tomar duas Coronas (cerveja mexicana que rappers como Snoop Dog adoram!) fui para a Grand Central Station onde peguei o trem de volta para Stamford (CT). Ele estava marcado para as 10:22 e saiu exatamente nesse horário. Incrivel! NYC, a SP que funciona!

Depois escrevo mais e explicarei porque não dá para beber aos domingos em Stamford... Pensar que vocês aí no Brasil estão reclamando da lei seca no trânsito! *rs*

17 comentários:

geologo disse...

Bem legal sua análise inicial sobre o cotidiano americano!
Se não aguentar sabe que o teu país tá de braços abertos!
Falou doido! Se eu for te visitar me arruma uma marijuana americana só para ver a onda!
Abraço!

Unknown disse...

Show de bola professor!
Que Deus continue sempre a te abençoar, aonde você for...

Um abraço,

Lianderson.
e-mail: liandersonbalves@gmail.com

debb disse...

Querido kibe!

adorei o seu relato! Fico feliz que esteja curtindo ai. Como pseudo-antropóloga achei incrível mesmo seu relato, porque são impressões que se não registradas, se perdem em no máximo 1 mês. Aproveite mesmo todo esse "novo" que vc ta vendo por ai.
E pode deixar, taxi preto, vou guardar essa dica =)
beijos
Debb

Thiago da Cuíca disse...

Aí Nego,

Não esquece de avisar quando for no Apollo... E também tive essa impressão de NYC ser uma São Paulo que funciona, com direito a viagens ilimitadas de trem a preço justo.

Boa sorte e se virar o campo, ano que vem te visito.

um abraço and Take care!

Espaço Cultural Resistência e Ousadia: Ponto de Cultura de Taboão da Serra disse...

Kibe,

Ducaralho sua descrição etnográfica, como de praxe. Espero que tenha tempo de atualizar sempre o blog...Pena que você escolheu esta carreira menor de sociólogo...Se os cara-pálidas (provavelmente ítalo-americanos nojentos) estão tomando o Harlem, os companheiros negão vão pra onde? Saudades de Malcon...
abraços
Luis Banespinha

Unknown disse...

Kibe, querido,

Uma delícia ler o seu blog. Saudades de vc. A Uninine para variar, uma loucura.

Beijos,
Cecília

Ari disse...

Hum, uma incursão analítica nos meandros do american style of life versão nova-yorkina, caracterizada por uma disjunção operacional entre o observador e o observado...em suma, manda mais, cara!

Unknown disse...

Kibe, to com inveja!! Saudades, Manda um abraço na nega!

Paty Marinho disse...

E aí mano!
Firmeza Kibe? Muito bom conhecer o Harlem pelo seu olhar. Tb curti as imagens do bairro e da sua rua no google maps!
Quando atualizar dá um toque!
Beijocas
Paty Marinho

Renata F.M. Astrogilda da Silva disse...

que bom que chegou bem, qdo pla manhã percebi que estava chovendo .... pensei em vc no avião.rs

minha amiga vai pra Sorbone...
só tenho amigo ducarai...
se cuida
bjs

Aline Salton disse...

Olá Professor.
Adorei o seu comentário, divertido como o senhor e me senti feliz por isso!(apesar da cor que cansa um pouco a vista pra ler).
Começaram as aulas do segundo semestre hoje e eu já estou com saudades das nossas conversas e seus conselhos.
Vou continuar acompanhando sua jornada.
Beijos
Sem mais

Kerida disse...

Oi Kibe! Que grata surpresa esse seu blog! Adorei a idéia, os relatos, os detalhes!!
Ficarei na torcida para que vc o atualize com frequência! Estarei por por aqui na expectativa de saber mais sobre NYC através dos seus olhos!!
Muito axé nessa sua nova fase!!
Beijos grandes,
Kelly

Clebão Tierno disse...

fala professor, não sei se parabenizo vc primeiro e se te agradeço...confesso a vc q sempre tive vontade de estar aí, mas a riqueza de detalhes q vc passou neste prim relato supriu temporariamente a mesma,rsrsrs, se te deixo contente, vou me empenhar mais nos estudos pra q um dia consiga estar aí, seja pra estudar ou a passeio, e saiba q vc iniciou isto...kkkk
Fica com Deus...sucesso.
Cleber Tierno/uninove.

Unknown disse...

E aí meu grande amigo e ex-colega!

Adorei os relatos! Você escreve muito bem, sabe valorizar os detalhes.
Um grande abraço,
Pedro

Anônimo disse...

Estou te acompanhando por aqui, na torcida por td de bom para vc. Neusa.

Unknown disse...

Kibe,

Sobre a tradição de ter um tipo de sofá ou cadeira na calçada como aí no Harlem, aqui no Centro de São Paulo temos alguma similaridade, mas por motivos bem diferentes. Os sofás ficam nas ruas porque o mercado é muito restrito para esse tipo de assento, segundo o que me informou o dono de uma dessas casas de móveis usados. Daí, a única solução é deixar os sofás nas ruas e esperar que algum maluco o leve de lá. Hehehe.
Um abraço

Márcio Macedo disse...

Porra, to me divertindo com os comentarios. Vou responder pouco a pouco, okay? Esse e o meu lema: "devagar e sempre"

1- Welitom.
Meu, com o prgrama tolerancia zero rolando a solta por NYC acho que nao e uma boa ideia eu, negrao, brasileiro, com visto de estudante comprar substancias ilegais por aqui. Hoje fui comprar cerveja num supermercado e o cara do caixa me perguntou: "Are you 21, sir?"... Ridiculo, mas tive que mostrar meu RG pro cara para confirmar que eu ja passei dos 21 ha muito tempo. Contudo, indico onde tem o bagulho, meu olho maloqueiro ja identificou o movimento... Caso queira se arriscar! *rs*

2- Lianderson, manda um pessoal para a classe de contabeis da Uninove Lapa!

3- Debb, ce sabe que todo antropologo e sociologo e um especie de escritor frustrado, ne? *rs* Pois e, estou exercitando minha frustracao nos meus relatos. Porem, devo lhe dizer, e divertido!
Beijos cariocas!

4- Hi Thiago,
O metro de NYC e sujo, feio e fedido, mas funciona! *rs* Alias, algo interessante que da pra fazer enquanto se aguarda o subway e ficar contando os ratos que dao role pelos trilhos. Parece um desfile, cada um mais gordinho que o outro (assim como os nova iorquinos!*rs*)...

5- Banespinha,
A negrada vai pra puta que... *rs* Brincadeira! Mas a tendencia e o povo sair de Manhattan e morar em lugares mais distantes como Queens, The Bronx e outras vizinhancas. Nada diferente de Sampa, mas aqui nao tenha nada parecido com Cidade Tiradentes, ainda... No final do ano tento arrumar o livro sobre bailes para voce, okay?! Nao esqueci nao!
Abraco,

PS: amanha respondo mais cinco... Ufaaa!!