A quantidade de coisas para fazer por aqui tem me impedido de escrever. Tanto é que o NewYorKibe registrará talvez seu número mais baixo de posts em um mês: apenas 3. Estou literalmente numa pegada "se correr o bicho pega se ficar"... Para resolver o problema, farei a promessa de escrever ao menos um post por semana, de preferência às segundas-feiras. Isso facilita a vida de todo mundo: @s leitore/as já sabem que toda segunda rolará alguma besteira por aqui e me obrigo/disciplino a postar algo interessante (ou não!). Aliás, minha sugestão é que tod@s @s leitore/as do nosso inbrog me sigam no Twitter, uma vez que tudo que leio e acho legal (a maioria não vira post) é tuitado (existe esse verbo???).
Mas não deixo de acompanhar o que rola na imprensa americana e os últimos dias tem sido quentes para a R&B ou neo-soul. Duas ladies da música negra americana contemporânea andam nas manchetes desde semana passada. A primeira é Jill Scott que escreveu um artigo (leia a parada AQUI) para a revista Essence no qual afirma que não consegue deixar de sentir certa sensação de traição ao ver um negrão com uma mulher branca. Uiiiii... Esse assunto dá pano pra manga (seja no Brasil ou EUA) e, como já era de se esperar, nossa diva foi acusada por alguns comentaristas mais exaltados de ser racista.
De minha parte, serei mais sensato. A fala de Scott representa o pensamento de um grande número de mulheres afro-americanas e, assim como os discursos contrários, deve ser respeitada e colocada dentro de contexto. A promessa de uma América pós-racial, que tanto se falou durante a campanha de Obama a presidência, é balela. O bicho continua pegando feio pro lado da negrada por aqui (com muito racismo, violência policial e desigualdade econômica/renda). Por outro lado, as discussões que envolvem o tema raça sempre são chapa quente. A fala de Jill, que foi pura emoção como diria meu truta Flávio "Jay Z" Francisco, também reflete um mal estar generalizado entre mulheres negras por conta do mercado matrimonial para afro-americanas com alto nível de educação onde há um defict de negrões firmeza a fim de colocar um anel de diamante no dedo das patrícias. O por quê? Bem, isso já é uma outra história que pode ser entedida em parte com a leitura de um post antigo do inbrog (leia AQUI).
Penso que Scott foi corajosa em evidenciar esse mal-estar generalizado das patrícias abrindo espaço para um diálogo aberto sobre os relacionamentos inter-raciais com suas delícias, possibilidades e problemas. Para não deixar o Brasil de fora, recomendo a leitura também no NewYorKibe (AQUI) da resenha do livro que fiz de minha amiga Laura Moutinho. Laurinha é antropóloga/professora da USP e fez uma linda pesquisa sobre o relacionamentos inter-raciais.
A outra notícia esta relacionada a texana ex de Andre 3000 e ex de Common (queria me incluir nessa lista também): senhorita Erykah Badu. Nas gravações para um videoclipe de seu novo álbum a patrícia ficou peladona em público bem no meio dos chapeludos de Dallas, Texas (queria estar lá pra conferir essa!). Detalhe: a parada se deu justamente no local onde o presidente John F. Kennedy (JFK) foi assassinado em 1963 com uma bala na cabeça. O lugar é considerado uma espécie de santuário pelos americanos e serve como atração turística. Nem preciso dizer que não se comenta outra coisa nos sites de música negra e em parte da grande mídia. Nenhuma queixa policial foi registrada pelas pessoas que estavam presentes quando o fato ocorreu (havia crianças presentes), mas ainda há chance das mesmas o fazerem o que renderia a cantora boas visitas a algum tribunal, multinhas, serviços comunitários e pedidos de desculpas em público (na velha tradição gringa de arrependimento em público na pegada de Tiger Woods!).
Badu afirmou que o vídeo tem a intenção de chamar a atenção para um termo oriundo nos anos 1950 chamado groupthink e que cujo efeito é a fobia que certas pessoas sofrem de se expressarem em público por receio da repressão/coerção que podem sofrer. A pergunta é: nega, você precisa ficar peladona em público para fazer as pessoas refletirem sobre isso? Well, no Brasil boa parte da rapaziada ia curtir uma parada dessas e aposto que em dois meses você seria capa da Playboy, mas na América (deles!)... Sei não, fia! A verdade é que, longe de querer me posicionar como conservador, os argumentos de Badu não me convenceram. Outro ponto importante: o ato rolou onde o presidente mais popular da história dos EUA foi morto há mais de quarenta anos atrás. Bem, é pedir pra causar polêmica: dito e feito! Por fim, tá todo mundo agora curioso para ver o vídeo, né? Sei nega, contestação ou jogada de marketing? Assista o vídeo da sistha AQUI. Peço licença as distintas senhoritas leitoras desse inbrog para fazer um comentário bem masculino: DONA BADU É UMA DELÍCIA! Vai ter tanta saúde assim lá na casa do chapéu mesmo depois de 3 filhos...
Aí, se você é daquele/as que gosta de andar mostrando sua cuequinha do Piu Piu e Frajola pelas ruas, saiba que o senador pelo Brooklyn, Mister Eric Adams, é seu inimigo e acha seu ato repugnante. O político está pondo na rua uma campanha no sentido de condenar e conter o que é conhecido por aqui como saggy pants: abaixar o jeans para mostrar a cueca samba-canção. A idéia é estabelecer um dress code nas escolas proibindo a molecada de mostrar a roupa de baixo. O título da campanha é: We Are Better Than This: Raise Your Pants Raise Your Image (nós somos melhores do que isto: erga sua calça, erga sua imagem). Sei lá, achei babaca essa campanha. Afinal, usei muito saggy jeans na minha adolescência pelas ruas de "Lixeira", interior de São Paulo, e nem por isso tive minha imagem depreciada. Leia a reportagem em inglês AQUI
Por fim, já que falamos de forma indireta de roupas e moda, nada como curtir o videoclipe do truta de SP, o rapper Rincon Sapiência, conhecido como Senhor Elegância. Seria bom saber o que ele acha dessa discussão da saggy jeans!
Muita Paz à Tod@s e Parabéns ao Rincon pelo clipe e pelo som: rimas sacadas e inteligentes.
Volto na segunda que vem!
quarta-feira, 31 de março de 2010
quarta-feira, 17 de março de 2010
Procrastinando a Gente Chega Lá!
Prezad@s Leitore/as, desculpe pelo sumiço! Tá f... por aqui: preguiça, cansaço, zilhões de coisas para fazer e o inbrog, como resultado disso tudo, acaba entrando em recesso. Mas enfim, estamos a apenas 3 dias da primavera aqui em New York Shit. Esse maldito inverno vai embora tarde! Hoje fez um dia maravilhosamente lindo e a última coisa que dá vontade de fazer é vir para a biblioteca estudar, mas... Fui aprovado no exame que andava me tirando o sono e agora só falta fechar três disciplinas para correr pro abraço e férias no Brasilsilsil comendo feijoada e bebendo pinga.
Voltando ao inbrog chegamos a um resultado da votação para escolha do título da campanha de orgulho negro (veja AQUI). Foram 34 votos, de acordo com o Intense Debate, gadget que administra os comentários da rapaziada aqui no inbrog. Houve sugestões até de trilha sonora para a parada, um barato! Mas enfim, o título vitorioso foi O BEIÇO É NOSSO (18 votos) seguido de BLACK IS BEIÇO (10 votos) e BBB: BEIÇO BONITÃO A BEÇA (6 votos). Mas a agitação continua. Dia 13 de Maio coloque uma foto sua fazendo beicinho (ou beição!) e o título da campanha no seus profiles da redes sociais a que pertence (Orkut e Facebook as mais famosas) ou mesmo MSN, Skype e Twitter. Afinal, O BEIÇO É NOSSO!
Mas mudando de assunto recebi hoje de Mila Felix via Twitter um vídeo perfeito para mim e meus amigos que, assim como eu, trabalham administrando o próprio tempo. Já ouviu falar do termo procrastinação? Pois é, dez anos atrás quando disse a meus amigos que sofria desse mal meus queridos trutas responderam de forma bem "delicada" que a parada não passava de uma tremenda frescura. Pois bem, digo com absoluta certeza que procrastinação, ou seja, um termo mais sofisticado para dizermos que estamos enrolando e/ou evitando fazer algo, é um mal que vai além da frescura. Há pessoas que, incapazes de controlá-la, procuram por ajuda psicológica. Isso vem se tornando cada vez mais frequente devido a todas essas distrações disponíveis na Internet. Impossível, dessa forma, não sucumbir a algum tipo de AÇÃO: procrastinação, masturbação, fornicação e por aí vai...
Assista os dois vídeos abaixo e entenda do que estou falando. Procrastinar é com nóiz memo!
Muita Paz!
E...
Procrastination from Johnny Kelly on Vimeo.
Voltando ao inbrog chegamos a um resultado da votação para escolha do título da campanha de orgulho negro (veja AQUI). Foram 34 votos, de acordo com o Intense Debate, gadget que administra os comentários da rapaziada aqui no inbrog. Houve sugestões até de trilha sonora para a parada, um barato! Mas enfim, o título vitorioso foi O BEIÇO É NOSSO (18 votos) seguido de BLACK IS BEIÇO (10 votos) e BBB: BEIÇO BONITÃO A BEÇA (6 votos). Mas a agitação continua. Dia 13 de Maio coloque uma foto sua fazendo beicinho (ou beição!) e o título da campanha no seus profiles da redes sociais a que pertence (Orkut e Facebook as mais famosas) ou mesmo MSN, Skype e Twitter. Afinal, O BEIÇO É NOSSO!
Mas mudando de assunto recebi hoje de Mila Felix via Twitter um vídeo perfeito para mim e meus amigos que, assim como eu, trabalham administrando o próprio tempo. Já ouviu falar do termo procrastinação? Pois é, dez anos atrás quando disse a meus amigos que sofria desse mal meus queridos trutas responderam de forma bem "delicada" que a parada não passava de uma tremenda frescura. Pois bem, digo com absoluta certeza que procrastinação, ou seja, um termo mais sofisticado para dizermos que estamos enrolando e/ou evitando fazer algo, é um mal que vai além da frescura. Há pessoas que, incapazes de controlá-la, procuram por ajuda psicológica. Isso vem se tornando cada vez mais frequente devido a todas essas distrações disponíveis na Internet. Impossível, dessa forma, não sucumbir a algum tipo de AÇÃO: procrastinação, masturbação, fornicação e por aí vai...
Assista os dois vídeos abaixo e entenda do que estou falando. Procrastinar é com nóiz memo!
Muita Paz!
E...
Procrastination from Johnny Kelly on Vimeo.
quinta-feira, 4 de março de 2010
For Marx, "Gód Iz Nóiz!"
Leitores/as do meu Brasil varonil, como vão? Espero que tudo esteja firmão! Hoje darei início a nossa série de posts sobre o que os clássicos da sociologia pensaram sobre religião. Começaremos a parada analisando nada mais nada menos do que o alemão barbudo mais famoso da história, Karl Marx (1818-1883). Ok, dá uma disputa boa entre ele e Albert Einstein (1879-1955), mas esse era bigodudo e não barbudo. Nosso amigão Marx nasceu de um casal de judeus convertidos ao luteranismo da classe média alemã sendo que o pai trabalhava como advogado. Vários "ismos" usados frequentemente no jargão intelectual vieram à tona no pensamento humanístico, político e social por meio dos escritos desse truta que dedicou sua vida a produzir uma obra que marca uma das mais ferrenhas críticas ao sistema econômico capitalismo (leia O Capital, 1867, sua obra máxima). Quem nunca ouviu falar dos palavrões que podiam render "cana" (ao menos no Brasil da ditadura e nos EUA do marcathismo) comunismo, socialismo e materialismo histórico?
Lembro que em minha infância, crescendo numa família católica, a idéia de comunismo estava associada a ateísmo. Repetia-se idéias estúpidas que comunistas comiam criancinhas - não no sentido pedófilo, mas canibal mesmo! - e que o estabelecimento de um regime comunista envolvia a perseguição as manifestações religiosas. De fato isso ocorreu na União Soviética, Polônia e China, mas sem muito sucesso. Well, mas vamos por partes, já diria Jack...
Marx, diferente de outros sociólogos como Durkheim e Weber, não possue uma sociologia da religião no sentido forte do termo, pois não fez de nenhuma manifestação religiosa objeto de estudo propriamente. Contudo, isso não significa que o autor não possua uma concepção sociológica de religião. Na verdade, a mesma está subordinada a seu instrumental teórico/metodológico de análise conhecido como "materialismo histórico". Porém, antes de nos debruçarmos sobre o termo para entender o que isso significa vale a pena fornecer uma definição genérica de religião e de como analistas sociais em geral - e sociólogos em específico - a abordam.
Religião pode ser entendido como um sistema unificado de crenças e práticas baseadas no sobrenatural que estabelece normas de conduta compartilhadas pelos fiéis sobre que é moralmente entendido como certo, errado, socialmente aceito ou reprovável. Religiões variam em número de deuses (monoteístas ou politeístas), ritos, corpo de sacerdotes, forma de relação entre entidades sobrenaturais e crentes, tipos de entidades e idéias de vida pós-morte física. Sociólogos buscam analisar a religião como um fenômeno social, ou seja, como algo que, descartando seu aspecto sobrenatural, só pode ser entendido racionalmente nas relações entre indivíduos vivendo em sociedade. Numa perspectiva sociológica ampla, religião é entendida como uma "instituição social" (assim como família, educação, instituições políticas e econômicas) que nada mais é do que padrões estabelecidos que definem formas específicas de se viver e são responsáveis pela socialização, manutenção, reprodução dos indivíduos e, consequentemente, da sociedade. Apesar de concordarem sobre esses aspectos gerais, sociólogos possuem interpretações distintas do fenômeno social religião. Vamos a elas, mas antes uma pausa para uma tira engraçadinha de Carlos Ruas...
A famosa frase de Marx de que a religião seria "o ópio do povo" é uma passagem do texto Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel (1843). Basicamente, o que o filósofo afirma aqui é que a religião é uma espécie de auto-alienação dos homens. Passagens similares - irônicas e demonstrando certo desprezo a manifestações religiosas - podem ser vistos em outros textos da juventude de Marx como A Questão Judaíca (1844) - texto que lhe rendeu acusações injustas de anti-semitismo - e A Ideologia Alemã (1845). Marx foi influenciado por Ludwig Feuberbach (1804-1872), filósofo alemão que publicou em 1841 uma ácida crítica a religião em seu livro A Essência do Cristianismo. Feuberbach afirmava que a filosofia hegeliana, hegemônica na Alemanha dessa época, promovia a idéia de que um espírito abstrato produzia e dominava o mundo material e, na crítica desse autor, essa perspectiva era vista como uma forma de idealismo. De acordo com Feurberbach a religião equivalia a uma forma de auto-alienação uma vez que ela representaria a "essência humana" na imagem de um Deus que é perfeito e, consequentemente, estabelece e evidencia a imperfeição dos homens. Para Feuberbach era necessário cessar essa mistificação entendendo a religião numa perspectiva racional findando assim a auto-alienação dos homens.
Marx concorda com Feuberbach em sua crítica a dialética hegeliana. Contudo, afirma o barbudo que os termos "essência humana" ou "homem" são abstratos ou vazios de significado se não forem entendidos dentro de uma perspectiva histórica. Homens e suas idéias (onde se insere a cultura e religião), para Marx, só podem ser entendidos como produtos sociais de sociedades específicas que mudam no curso do desenvolvimento histórico. Diferente de Feuerbach, que vê a religião como um reflexo da realidade material, Marx entende que há uma relação de determinismo entre formas de organização da produção material dos homens e suas idéias/cultura, essa relação é a chave de entendimento do processo (ou desenvolvimento) histórico: materialismo histórico. Em termos mais humanos isso corresponde a dizer que cada época histórica possue formas específicas de organizar a produção econômica (meios de produção e relações de trabalho entre classes) que determinam as idéias e cultura (ou tudo que seja abstrato) produzidas naquele contexto. O que Marx busca fazer é mostrar os vínculos existentes - e determinantes - entre, de um lado, atividade material/econômica dos homens e, de outro, produção imaterial ou, em termos mais simples, coisas abstratas como idéias, cultura e, consequentemente, religião.
O sociólogo defende o argumento que entidades abstratas são criadas pelos homens ao produzirem sua sobrevivência material e obtêm autonomia dos mesmos quando passam a fazer parte da esfera da auto-alienação humana. Isso corresponde a dizer que entidades como o Estado, o dinheiro e Deus se objetificam - uma vez que reificação/objetificação é a prática da alienação - incorporando a "essência humana" e dominando o homem. Assim sendo, o Estado, o dinheiro e Deus passam a funcionar como intermediários entre os homens e a sua própria liberdade. Em suma, homens se subordinam a essas entidades "estranhas" citadas anteriormente, pois as mesmas só passam a ter existência e poder dentro de condições materiais e históricas específicas.
Entretanto, para Marx, a religião teria um papel secundário no mundo contemporâneo uma vez a dominação por excelência se daria na esfera econômica e manifestações religiosas tenderiam a ser toleradas, mas estavam relegadas a contextos/espaços não determinantes das transformações sociais e políticas. Não é preciso refletir muito para concluir que o barbudo estava meio equivocado, né? Basta pensar em momentos históricos de vários contextos em que a religião foi fator prepoderante de organização política como o movimento pelos direitos civis nos EUA dos anos 1960, a Revolução Islâmica no Irã em 1979/1980, o papel de setores da Igreja Católica na América Latina dos anos 1970/1980 atuando politicamente orientados pela ideologia da libertação e o peso político de líderes religiosos em questões políticas como na intricada e complicada relação Tibete-China.
Na sequência voltaremos com o francês Durkheim.
Muita Paz!
Lembro que em minha infância, crescendo numa família católica, a idéia de comunismo estava associada a ateísmo. Repetia-se idéias estúpidas que comunistas comiam criancinhas - não no sentido pedófilo, mas canibal mesmo! - e que o estabelecimento de um regime comunista envolvia a perseguição as manifestações religiosas. De fato isso ocorreu na União Soviética, Polônia e China, mas sem muito sucesso. Well, mas vamos por partes, já diria Jack...
Marx, diferente de outros sociólogos como Durkheim e Weber, não possue uma sociologia da religião no sentido forte do termo, pois não fez de nenhuma manifestação religiosa objeto de estudo propriamente. Contudo, isso não significa que o autor não possua uma concepção sociológica de religião. Na verdade, a mesma está subordinada a seu instrumental teórico/metodológico de análise conhecido como "materialismo histórico". Porém, antes de nos debruçarmos sobre o termo para entender o que isso significa vale a pena fornecer uma definição genérica de religião e de como analistas sociais em geral - e sociólogos em específico - a abordam.
Religião pode ser entendido como um sistema unificado de crenças e práticas baseadas no sobrenatural que estabelece normas de conduta compartilhadas pelos fiéis sobre que é moralmente entendido como certo, errado, socialmente aceito ou reprovável. Religiões variam em número de deuses (monoteístas ou politeístas), ritos, corpo de sacerdotes, forma de relação entre entidades sobrenaturais e crentes, tipos de entidades e idéias de vida pós-morte física. Sociólogos buscam analisar a religião como um fenômeno social, ou seja, como algo que, descartando seu aspecto sobrenatural, só pode ser entendido racionalmente nas relações entre indivíduos vivendo em sociedade. Numa perspectiva sociológica ampla, religião é entendida como uma "instituição social" (assim como família, educação, instituições políticas e econômicas) que nada mais é do que padrões estabelecidos que definem formas específicas de se viver e são responsáveis pela socialização, manutenção, reprodução dos indivíduos e, consequentemente, da sociedade. Apesar de concordarem sobre esses aspectos gerais, sociólogos possuem interpretações distintas do fenômeno social religião. Vamos a elas, mas antes uma pausa para uma tira engraçadinha de Carlos Ruas...
A famosa frase de Marx de que a religião seria "o ópio do povo" é uma passagem do texto Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel (1843). Basicamente, o que o filósofo afirma aqui é que a religião é uma espécie de auto-alienação dos homens. Passagens similares - irônicas e demonstrando certo desprezo a manifestações religiosas - podem ser vistos em outros textos da juventude de Marx como A Questão Judaíca (1844) - texto que lhe rendeu acusações injustas de anti-semitismo - e A Ideologia Alemã (1845). Marx foi influenciado por Ludwig Feuberbach (1804-1872), filósofo alemão que publicou em 1841 uma ácida crítica a religião em seu livro A Essência do Cristianismo. Feuberbach afirmava que a filosofia hegeliana, hegemônica na Alemanha dessa época, promovia a idéia de que um espírito abstrato produzia e dominava o mundo material e, na crítica desse autor, essa perspectiva era vista como uma forma de idealismo. De acordo com Feurberbach a religião equivalia a uma forma de auto-alienação uma vez que ela representaria a "essência humana" na imagem de um Deus que é perfeito e, consequentemente, estabelece e evidencia a imperfeição dos homens. Para Feuberbach era necessário cessar essa mistificação entendendo a religião numa perspectiva racional findando assim a auto-alienação dos homens.
Marx concorda com Feuberbach em sua crítica a dialética hegeliana. Contudo, afirma o barbudo que os termos "essência humana" ou "homem" são abstratos ou vazios de significado se não forem entendidos dentro de uma perspectiva histórica. Homens e suas idéias (onde se insere a cultura e religião), para Marx, só podem ser entendidos como produtos sociais de sociedades específicas que mudam no curso do desenvolvimento histórico. Diferente de Feuerbach, que vê a religião como um reflexo da realidade material, Marx entende que há uma relação de determinismo entre formas de organização da produção material dos homens e suas idéias/cultura, essa relação é a chave de entendimento do processo (ou desenvolvimento) histórico: materialismo histórico. Em termos mais humanos isso corresponde a dizer que cada época histórica possue formas específicas de organizar a produção econômica (meios de produção e relações de trabalho entre classes) que determinam as idéias e cultura (ou tudo que seja abstrato) produzidas naquele contexto. O que Marx busca fazer é mostrar os vínculos existentes - e determinantes - entre, de um lado, atividade material/econômica dos homens e, de outro, produção imaterial ou, em termos mais simples, coisas abstratas como idéias, cultura e, consequentemente, religião.
O sociólogo defende o argumento que entidades abstratas são criadas pelos homens ao produzirem sua sobrevivência material e obtêm autonomia dos mesmos quando passam a fazer parte da esfera da auto-alienação humana. Isso corresponde a dizer que entidades como o Estado, o dinheiro e Deus se objetificam - uma vez que reificação/objetificação é a prática da alienação - incorporando a "essência humana" e dominando o homem. Assim sendo, o Estado, o dinheiro e Deus passam a funcionar como intermediários entre os homens e a sua própria liberdade. Em suma, homens se subordinam a essas entidades "estranhas" citadas anteriormente, pois as mesmas só passam a ter existência e poder dentro de condições materiais e históricas específicas.
Entretanto, para Marx, a religião teria um papel secundário no mundo contemporâneo uma vez a dominação por excelência se daria na esfera econômica e manifestações religiosas tenderiam a ser toleradas, mas estavam relegadas a contextos/espaços não determinantes das transformações sociais e políticas. Não é preciso refletir muito para concluir que o barbudo estava meio equivocado, né? Basta pensar em momentos históricos de vários contextos em que a religião foi fator prepoderante de organização política como o movimento pelos direitos civis nos EUA dos anos 1960, a Revolução Islâmica no Irã em 1979/1980, o papel de setores da Igreja Católica na América Latina dos anos 1970/1980 atuando politicamente orientados pela ideologia da libertação e o peso político de líderes religiosos em questões políticas como na intricada e complicada relação Tibete-China.
Na sequência voltaremos com o francês Durkheim.
Muita Paz!
Assinar:
Postagens (Atom)