domingo, 20 de outubro de 2013

Para o Nosso "Ben"


Acordei tarde hoje e fui à cozinha onde minha mãe já dava os toques finais ao almoço: raviolli (acho que é assim que se escreve). Meu pai que é um ranzinza charmoso reclamava: "Mas só tem isso pra comer? E o arroz, feijão..." Sim, ele nunca come sem esses acompanhamentos. De minha parte, estava no processo de preparar minha dose diária de droga: cafeína.  A TV da cozinha, há três na casa, estava sintonizada na Globo e transmitia o programa de Regina Casé, Esquenta. Não tenho saco nenhum para a programação da Globo, acho imbecilizante. Contudo, não há como você fugir dela em sua vida. Pelos posts de meus/minhas amigo/as no Facebook fico sabendo quais são os artistas quentes do The Voice Brasil, como foi a polêmica participação de Edi Rock no Caldeirão do Huck e que em alguma novela estão querendo fazer um moleque preto cortar o seu cabelo "selvagem". Pois bem, voltemos ao Esquenta. Nunca me dei ao trabalho de assistir a esse programa, acho chato. Por outro lado, entendo que o mesmo faz parte de uma política de reconhecimento e representação que coloca preto/as na TV e parte de suas manifestações culturais. E como é padrão Globo, o/as pretinho/as são super produzido/as e bonito/as. Dei uma "bizoiada" no programa enquanto preparava meu pretinho forte. Lá estavam Arlindo Cruz, Preta Gil, a garotada de um videoclipe de passinho patrocinado pela Coca-Cola que está circulando na internet (eu acho), a garota negra carioca que ficou famosa fazendo piadas sobre o comportamento das pessoas no Facebook além do músico Jorge Benjor. Mais um pouco de programa e Benjor faz uma performance cantando W/Brasil. Nesse momento lembrei de conversas que tenho sempre com meus amigos e namorada: Benjor um dia foi legal e nem era Benjor, mas sim Ben. Explico.


Jorge Benjor é uma referência musical para todo/as aquele/as que frequentaram espaços de sociabilidade negra e pobre em São Paulo entre os anos 1960 e 1990.  Em qualquer batizado, festa de aniversário, casamento, baile, jantar dançante, churrasco, festa de debutante e outras festividades eram e ainda são tocadas músicas clássicas de Benjor compostas e gravadas por ele entre os 1960 e 1980. Aliás, muitas pessoas ainda se referem a ele nesses espaços como Ben e não Benjor, nome que o artista incorporou nos anos 1980 para evitar confusão com o músico norte-americano George Benson. Mas a mudança de nome pode ser interpretada também como uma linha divisora da musicalidade do artista. Se o Ben fazia uma tipo de música marcada por uma mistura magistral entre bossa-nova, soul, jazz, samba, funk e rock, que alguns classificaram como a melhor definição do que seria o samba-soul ou sambalanço ou samba-rock, o Benjor dos anos 1990 conseguiu sair de uma crise em sua carreira fazendo uma espécie de sonoridade que lembra em muito marchinhas chatas de carnaval e prestando homenagens a figuras conhecidas como o músico Tim Maia (o "síndico" da canção) e o publicitário Washington Olivetto (que segundo consta, encomendou a música). Pode ser sacanagem da minha parte, mas não lembro de nenhuma música contemporânea de Benjor além de W/Brasil. Definitivamente, a negrada que eu conheço e me incluo aclama e ouve o Jorge Ben e desconhece o Benjor. Para o nosso Ben!

Muita Paz, Muito Amor!

sábado, 12 de outubro de 2013

Os Sete Anões de Auschwitz


12 de outubro: Dia das Crianças e de Nossa Senhora Aparecida. Parabéns aos dois! Sou um adulto ranzinza e devoto de São Benedito. Não darei doce as crianças e nem farei orações para a santa errada, fiquem tranquilos.

Post rápido, hoje é feriado. Deixo como dica para esse sábado preguiçoso - caso você não vá a igreja ou alguma festa de criança - um ótimo documentário que assisti tempos atrás por sugestão de meu truta Dafne Sampaio: The Seven Dwarfs of Auschwitz (Os Sete Anões de Auschwitz). O filme conta a história de uma família de anões que é deportada para o campo de concentração de Auwschwitz e se torna objeto de interesse do Anjo da Morte: Josef Mengele.

Assistam (audio e legendas em inglês apenas).

Muita Paz Muito Amor!


sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Um Beijo e Adeus Para Gabriela!


Faleceu ontem à noite, aos 62 anos, Gabriela Leite.  Durante boa parte da sua vida Leite trabalhou como prostituta e atuou como ativista em defesa dos direitos das profissionais do sexo (um termo que ela achava muito politicamente correta e preferida o termo "puta") reivindicando a regularização da profissão. Durante a juventude Gabriela chegou a estudar filosofia na Universidade de São Paulo (USP), mas acabou deixando o curso e um trabalho de secretária em escritório para se dedicar a prostituição na região da Boca do Lixo em São Paulo e posteriormente na zona boêmia de Belo Horizonte e na Vila Mimosa no Rio de Janeiro. Em 1987 ela organizou o primeiro Encontro Nacional de Prostitutas e ganhou notoriedade por sua militância criando em 1992 a ONG Dávida.  Um das suas iniciativas mais conhecidas foi a criação, em 2006, da marca Daspu, cuja as roupas eram elaboradas e costuradas por prostitutas. O nome era uma clara ironia a loja de artigos de luxo Daslu. Em 2010 Gabriela concorreu ao cargo de deputada federal pelo Partido Verde. Sua campanha foi coberta num documentário filmado pela americana Laura Murray intitulado Um Beijo Para Gabriela (trailer logo abaixo).


Gabriela se vai vítima de câncer. O que ela nos deixa como legado além de seu trabalho como ativista é uma postura que olhava a prostituta sem o viés moralizante ou vitimizador. De acordo com ela, a prostituição era uma profissão que deveria ser regulamentada para que seus/suas profissionais tivessem acesso aos mesmos benefícios que o/as trabalhadore/as de outras áreas e fosse assim quebrado o estigma que paira sobre o/as mesmo/as. Para saber mais da vida de Gabriela leia a sua biografia lançada em 2009 pela Objetiva e intitulada Filha, Mãe, Avô e Puta (baixe AQUI).

A foto abaixo foi tirada em abril desse ano na exibição do filme sobre a campanha de Leite na The New School, NYC. Da esquerda para direita estão eu, Cristian Mat, Flávio Lenz (companheiro de Gabriela), Mariana Assis, Geeti Das e Laura Rebecca Murray (diretora do filme). 

Um beijo e adeus para Gabriela! Descanse em paz, querida! 

Muita Paz, Muito Amor!

terça-feira, 8 de outubro de 2013

"and that's your time": THEESatisfaction


Há um bom tempo que não escrevo por aqui. Mudanças mil. Volta ao Brasil, trabalho de campo para o doutorado em São Paulo, refúgio/castigo em Limeira, dificuldades e processo de leitura e escrita. Enfim, vida! Mas o motivo para voltar a escrever é uma notícia boa: o lançamento de uma nova mixtape do duo feminino de rap THEESatisfaction (foto acima).

Essas duas garotas oriundas de Seattle (sim, a cidade na qual surgiu o grunge nos anos 1990 e que nos premiou com a banda Nirvana) são uma grande novidade na cena alternativa do hip-hop norte-americano. Elas são descoladinhas, meio hipsters (no bom sentido!), lésbicas e fazem um som com inspiração nos anos 1980. Ano passado assisti o show delas numa casa em Williamsburg, Brooklyn, NYC, e adorei! O primeiro álbum delas saiu ano passado e leva o título de awE naturalE. Das treze faixas desse disco minhas preferidas são Bitch, QueenS (cujo videoclipe que segue logo abaixo é uma espécie de celebração ao amor gay/lésbico), Existinct e Sweat (um dos samplers usados nessa faixa lembra muito música brasileira). As faixas God e Enchantruss contam com a participação de Ishmael Butler aka "Palaceer Lazaro"; ele foi um dia "Butterfly" do clássico grupo de jazz-rap dos anos 1990 Digable Planets e agora lidera o grupo alternativão Shabazz Palaces.



Depois de awE as garotas lançaram mixtapes em homenagem as suas maiores influências: THEESatisfaction Loves Anita Baker (outubro de 2012) e THEESatisfaction Loves Erykah Badu (janeiro de 2013). Delas destaco a faixa Cabin Fever Sweet (Live on the Radio K) que tem um sampler maravilhoso da canção Sweet Love, hit dos anos 1980 na voz de Anita Baker. Confira o som no videoclipe abaixo. Na vasta produção das garotas há ainda as mixtapes That's Weird (novembro de 2008), Snow Motion (agosto de 2009), Why We Celebrate Colonialism (novembro de 2009), THEESatistaction Loves Stevie Wonder Wonder Why We Celebrate Colonialism (julho de 2010), THEESatisfaction LIVE on KEXP Street Sounds (fevereiro de 2010), as faixas Icing (novembro de 2009) e Astronomical Warfare (outubro de 2009) e os álbuns digitais Transitions (novembro de 2010), Sandra Bollocks Black Baby (março de 2011) e o lançado hoje and that's your time



As letras das garotas são engajadas versando sobre sexualidade, racismo, gênero, desigualdades sociais e outras paradas. Um detalhe interessante é que elas lançaram duas mixtapes cujos títulos perguntavam "Por que celebramos o colonialismo?" justamente em datas cívicas dos EUA: dia da independência e dia de Ação de Graças.

Enfim, baixe os discos, mixtapes e faixas e curta o som engajado e experimental de THEESatisfaction!

Muita Paz e Muito Amor!